Suspensão de eventos para contenção da pandemia de coronavírus (Covid-2019). O que a história nos conta sobre isso?

Por Rodrigo Campos, Fundador da Smart Defesa.

Desfile em 1918 na Filadélfia, no Estado da Pensilvânia, nos EUA.

A última sexta-feira, 13/03, foi um dia marcante para organizadores, promotores, patrocinadores, expositores e para participantes de eventos voltados para os mercados de defesa, segurança, aeroespacial e naval no Brasil e no mundo. Para fins didáticos, irei agrupá-los e os chamarei de eventos de defesa.

A maioria dos eventos de defesa programados para o primeiro semestre de 2020, por conta das medidas de contenção da pandemia de coronavírus (Covid-19), ou foram suspensos por iniciativa dos seus organizadores, ou estão desautorizados por medidas adotadas pelos governos e autoridades, ou se tornaram inviáveis pela possibilidade da ausência de público.

Para citar alguns exemplos, noticiamos na Smart Defesa o cancelamento da DIMDEX 2020 no Catar, a suspensão da LAAD Security 2020 no Brasil e da Feira Internacional do Ar e Espaço (FIDAE) no Chile. Todos esses são grandes eventos, com públicos de milhares pessoas. Porém, eventos menores foram impactados como, por exemplo, o #VemPraMinas – Aeroespacial 2020 no estado de Minas Gerais.

É verdade que os eventos de qualquer natureza têm sido afetados, desde jogos e campeonatos de futebol à corridas de Motovelocidade e de Fórmula 1, festivais e shows, de peças de teatro à festas. Empresas estão adotando o trabalho em esquema de home office e reuniões convertidas em videoconferência, assim como aulas em escolas e universidades têm sido suspensas, entre outras medidas.

Os eventos que ainda não foram suspensos, por todo o contexto, projeções e medidas de contenção que estão sendo divulgadas, é possível presumir que trata-se apenas de questão de tempo para que sejam.

A decisão de adiamento, suspensão ou cancelamento de eventos no Brasil e em vários países não depende mais exclusivamente dos seus organizadores. Elas estão sendo orientadas por medidas de contenção de coronavírus (Covid-19) que têm sido divulgadas nas últimas semanas, sobretudo, nos últimos dias.

Um caso emblemático foi o anuncio da suspensão da FIDAE feito pelo presidente do Chile, Sebastián Piñera, numa entrevista à TV Chilena, antes mesmo que fosse anunciada pela organização do evento:

Canal Caiafa Master: Entrevista do presidente chileno Sebastián Piñera.

Para se ter ideia da dimensão que podem alcançar os eventos de defesa, a FIDAE é considerada o mais importante evento do setor aeroespacial na América Latina no hemisfério sul e a 3ª em nível mundial. A expectativa para a edição de 2020 era reunir mais de 500 delegações, de cerca 60 países e superar a média de público das edições de 2016 e 2018, que foi de 120 mil visitantes.

LAAD Security, também suspensa, é focada no setores de segurança pública e corporativa, teve na sua edição de 2018 8.350 visitantes, recebeu 17 delegações oficiais e 453 autoridades de segurança pública.

O mercado de eventos está inserido no segmento de Turismo de Negócios e Eventos (TNE). O TNE identifica o turismo cuja finalidade seja a realização de negócios, parcerias e demais atividades de cunho profissional, bem como da participação em eventos de interesse profissional, associativo, institucional, seja de caráter comercial, promocional ou técnico e científico.

O promissor mercado de TNE cresceu 14,7% no primeiro semestre de 2019 no comparativo com 2018 e movimentou, em todo o Brasil, R$ 5,57 bilhões, aproximadamente 33% mais do que as viagens motivadas por lazer, segundo a Associação Brasileira das Agências de Viagens Corporativas (Abracorp).

São Paulo é o município brasileiro com melhor resultado. A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FECOMERCIOSP), destaca um estudo da Expedia, que aponta São Paulo como o 18º destino popular de negócios no mundo. Já o levantamento “Índice de Destinos Globais” da MasterCard, mostra que o segmento é responsável por 67% da movimentação turística da capital.

Um estudo da FecomercioSP, em sua Pesquisa Conjuntural do Setor de Serviços (PCSS), calcula que em 2018, as empresas ligadas ao TNE, tenham encerrado ano com faturamento de R$ 7,65 bilhões.

Dados do Ministério do Turismo brasileiro sobre a demanda internacional, mostram que em 2018, o TNE foi o 3º principal motivo da vinda de estrangeiros ao Brasil, com 13,5% do total, sendo que, deste porcentual, 48,7% tiveram como destino São Paulo. Rio de Janeiro ficou com 19,7%, Curitiba 4,5%, Campinas 3,9% e Porto Alegre 3,4%. O gasto médio per capita, por dia, desses viajantes foi de US$ 84,33.

A Associação Internacional de Congressos e Convenções (ICCA) apontou o Brasil como o principal destino Latino Americano para a realização de congressos e eventos corporativos. Em todo mundo, o país está entre os 20 destinos mais procurados por executivos, ocupando a 17ª posição.

Mas a questão que tem sido discutida é a real necessidade de medidas consideradas por alguns tão drásticas, ou precipitadas, com impacto para diferentes ramos e atividades econômicas.

Existem justificativas técnicas no presente que podem sustentá-las como a necessidade de controlar a curva de propagação do contágio pelo coronavírus (Covid-19) e, desse modo, não sobrecarregar o sistema público de saúde como se observou em outros países que foram duramente afetados pela pandemia.

O que o passado ensinou, ou deveria ter ensinado?

É no passado que encontraremos exemplos da importância das medidas de contenção. Me concentrarei em acontecimentos da pandemia da Gripe Espanhola (1918 – 1920), que já abordei no artigo Coronavírus x Pandemia x Biodefesa e a BID.

Chamo atenção para o episódio de um evento de defesa que definiu a sorte de toda uma região, com desfecho dramático para a cidade da Filadélfia, no Estado da Pensilvânia, nos EUA.

Porém, antes é preciso marcar as diferenças entre aquele e o atual momento. A Gripe Espanhola era mortal e o contexto do mundo era bem diferente. Em 1918, chegava ao fim a I Guerra Mundial.

Não há equiparação no número de mortes. Estima-se que a Gripe Espanhola tenha feito dezenas de milhões de vítimas em todo o mundo, enquanto o novo coronavírus contabiliza, felizmente, um número muito menor de mortes. O total de mortes até agora é um quinto do número de pessoas que morreram somente na Filadélfia, uma das cidades americanas mais impactadas pela Gripe Espanhola.

A semelhança entre as pandemias do novo coronavírus (Covid-19) e a Gripe Espanhola está justamente na escala e na necessidade de restringir aglomerações e ampliar a vigilância sobre pessoas infectadas.

E é justamente nos acontecimentos da Filadélfia que concentraremos a analogia que esse artigo pretende.

Em setembro de 1918, a Filadélfia realizou o Liberty Loan Parade planejado para promover e vender títulos do governo que estavam sendo emitidos para pagar os custos da I Guerra Mundial. Mesmo contrariando avisos e recomendações de especialistas, pois, a Gripe Espanhola já era conhecida, o desfile ocorreu no mesmo período em que o vírus H1N1 chegou à cidade que 2 milhões de de pessoas.

Esperava-se, inicialmente, que 10 mil pessoas assistissem ao último desfile do Liberty Loan Parade. Mas, em meio à crescente empolgação pelo fato da I Guerra estar chegando ao fim, 200 mil pessoas foram à parte central da cidade enquanto milhares de militares, trabalhadores da indústria de defesa, socorristas, batedores e veteranos marchavam pela Broad Street, uma das principais ruas da cidade.

O desfile tornou-se uma oportunidade para infecção em massa. Em poucos dias, a gripe se tornou tão disseminada que a Filadélfia que as autoridades estaduais fecharam a cidade. Na terceira semana de outubro, a Gripe Espanhola, ou “a Gripe”, como era chamada por muitos, havia afligido dezenas de milhares de pessoas e tirado a vida de milhares delas só na Filadélfia.

“A decisão de realizar o Liberty Loan Parade foi mais uma de uma série de decisões que, penso, contribuíram para o alto número de mortos”, disse o historiador John M. Barry, autor de “The Great Influenza”. “Quando você mistura política e ciência, você obtém política.”

Apenas 5 dias depois, autoridades determinaram o fechamento de escolas, igrejas e bares e proibiram funerais em locais públicos. Mas o número de casos de infecção já havia aumentado tanto que centenas de pessoas morriam todos os dias. O pico foi em 12 de outubro com quase 900 mortes num único dia.

  • O ponto comum é a necessidade de medida para prevenção e contenção. Um século depois, o coronavírus faz o mundo reviver as medidas drásticas de isolamento e de vigilância.

“O novo coronavírus é, provavelmente, uma ameaça tão séria como foi a Gripe Espanhola de 1918, em relação às medidas de contenção que deverão ser postas em prática”, diz Benjamin Cowling, chefe da divisão de epidemiologia e bioestatística da Universidade de Hong Kong, uma das instituições na linha de frente das pesquisas sobre o coronavírus.

Vale assistir o vídeo publicado no canal O Antagonista que remete à Gripe Espanhola, em 1918. Nele há relato de evento de defesa que aconteceu na Filadélfia, no Estado da Pensilvânia, nos EUA, que serviu para a propagação do mortal vírus influenza:

Durante o outono de 1918, nos últimos meses da Primeira Guerra Mundial, a Filadélfia sediou o maior desfile de sua história. Em poucos dias, as vítimas da Gripe Espanhola sobrecarregaram os hospitais. Na apresentação a seguir, em inglês, o Robert D. Hicks, diretor do Museu Mütter, discute a pandemia como uma catástrofe social.


A pandemia será superada.

Assim como a humanidade superou a Gripe Espanhola e outras ela também vai superar a pandemia de coronavírus (Covid-2019). Os mercados e negócios que estão sendo afetados também vão encontrar outros caminhos e outros mercados e negócios vão surgir à partir dessa crise.

Por ora, temos que nos adaptar ao novo contexto. Se o isolamento social que nos tem sido recomendado (ou imposto) como medida de contenção da pandemia de coronavírus (Covid-2019) limita os deslocamentos físico, temos a nosso favor a tecnologia.

Certamente, veremos um incremento da oferta de eventos através da internet. A própria Smart Defesa, que já tinha no seu planejamento oferecer esse tipo de formato de evento, vai lançar em uma consistente oferta de painéis, seminários, e congressos exclusivamente via internet.

A nosso favor temos a tecnologia e não há motivo para não a utilizarmos na plenitude das suas possibilidades.

“As espécies que sobrevivem não são as espécies mais fortes, nem as mais inteligentes, e sim aquelas que se adaptam melhor às mudanças”. Essa frase é atribuída à Charles Darwin embora exista o questionamento se realmente foi dita por ele. De qualquer maneira, expressa a necessidade de adaptação que o momento nos exige.

Aos meus pares organizadores e realizadores de evento, digo que o momento pede por união. Podemos fazer grandes eventos de defesa na internet. Mas há uma curva de aprendizado que pode ser reduzida se fizermos as conexões e parcerias certas.

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