SK-105 Kürassier – Pequeno, versátil e mal-afamado

Em 10 de agosto de 2021, alguns blindados dos Fuzileiros Navais, destinados a participar de um exercício operacional, fizeram um improvisado desfile militar em Brasília que suscitou diversas reportagens “sensacionalistas” por parte da chamada “mídia de massa”. T&D, assumindo seu papel de “mídia especializada”, em sua edição nº 164, publicou uma pequena analise técnica sobe o CCL SK-105 para contrapor as críticas e, devido ao inicio do processo de substituição, considera relevante a republicação no website para fomentar novamente a discussão.

Paulo Roberto Bastos Jr.

No começo de agosto houve, na Esplanada dos Ministérios e Praça dos Três Poderes, em Brasília (DF), um rápido e não esperado desfile de viaturas da Marinha que participariam da Operação Formosa, tradicional exercício dos Fuzileiros Navais (CFN), com a entrega simbólica de um convite para o presidente da República, Jair Bolsonaro, participar da demonstração quando do encerramento. Entretanto, o ineditismo do ato e face à complicada situação política que assola o País induziu boa parte da mídia, por desconhecimento (ou outros interesses), a subverter completamente o fato atendo-se a detalhes nada elogiosos para os militares e os equipamentos empregados.

Um dos principais alvos dos chamados formadores de opinião, ávidos por verem frutificar teorias conspiratórias e bombásticas foi o carro de combate leve SK-105 A2S Kürassier, presenteado com a alcunha de “tanque obsoleto” que ganhou notoriedade soltando “fumaça preta”. Mas de que se trata esse veículo, qual sua função e o principal, estará mesmo obsoleto?

Em uma torre oscilante, o canhão é montado no teto da torre e isso faz com que ele fique bem acima do chassi, permitindo se ocultar no terreno enquanto efetua os disparos

O VEÍCULO

O projeto do SK-105 iniciou-se em meados dos anos de 1960, na empresa Saurer-Werk, para atender ao Exército Austríaco. Buscava-se um veículo anticarro leve e manobrável, com capacidade de neutralizar os modelos mais pesados da época, ou seja, um “tank destroyer” (destruidor de tanques). 

Começou a entrar em operação em 1971, transformando-se um dos principais sistemas de armas da Áustria, caso ocorresse a temida invasão soviética nos anos de 1970, com milhares de carros de combate T-55, T-62 e T-72. Devido a suas características, baixo custo de aquisição e manutenção, foi um sucesso de exportação comprado por diversos países, como o Iraque (que o usou em combate na guerra contra o Irã).  Ainda está em serviço na Bolívia, Botsuana, Marrocos, Tunísia e Argentina, a qual chegou a alinhar cerca de 150 unidades, criando, inclusive, uma versão local, o Patagón, cujo programa foi cancelado depois do quarto exemplar construído.

É equipado com uma torre oscilanlante, similar ao AMX-13, armada com canhão raiado francês da família 105G1, de 105mm e 57 calibres que, em suas versões mais recentes, é capaz disparar um projétil cinético APFSDS a uma velocidade de cerca de 1.430 m/s, com capacidade de perfurar a grande maioria dos blindados da atualidade, dependendo da distância.

Na época, o CFN se esforçava para manter quatro SK-105 em condições operacionais, porem, na Operação Formosa 2021 só contava com dois

O projeto privilegiou a mobilidade em detrimento da proteção balística que resiste apenas a canhões de até 35mm em sua parte frontal e fuzis de assalto lateralmente. O baixo peso (menos de 20 toneladas), permite que seja transportado com facilidade até o campo de batalha, seja por aeronaves ou pequenas embarcações. E foi justamente isso que chamou a atenção da Marinha.

No início dos anos de 1980, o CFN ativou a Companhia de carros de combate (Cia CC) para prover limitado apoio nas operações anfíbias, principalmente nos estágios de conquista de uma cabeça de praia. Concluídos vários estudos, dentre as opções possíveis naquele momento, optou-se pela a aquisição dos blindados sobre rodas Engesa EE-9 Cascavel, mesmo com o consenso de que o ideal seria uma viatura sobre lagartas.

Por mais de 20 anos o EE-9 Cascavel foi usado na função de um carro de combate com as limitações relativas à mobilidade e poder de fogo (canhão de 90mm), cumprindo a tarefa, definido uma doutrina operacional, servindo de base para um sucessor.

Nos anos 2000 uma proposta de reestruturação dentro do CFN foi apresentada trazendo em seu bojo a transformação da Cia CC no Batalhão de Blindados de Fuzileiros Navais (BtlBldFuzNav), o que ocorreu em 2003, e a melhoria dos meios blindados. No entanto, não foi uma escolha simples já que, devido às particularidades operacionais, o veículo deveria ser capaz de ser desembarcado na praia, junto às tropas, e a partir dos recursos que a Marinha possuía. Assim, não poderia ser pesado e, dessa forma, a escolha dos SK-105 mostrou-se óbvia.

Em 2001 chegaram 17 SK-105 A2S e um 4KH7FA Greif (viatura de socorro), novos e com todas as melhorias e atualizações ocorridas no decorrer do projeto. A versão brasileira apresentava miras diurnas e noturnas, estabilizadas, para o comandante; visor telescópico, com ampliação de 8x, apontador e telêmetro laser, integrados à mira, para o atirador; e controle de fogo computadorizado, com grande capacidade para acertar, no primeiro disparo, alvos estáticos e em movimento. Todas tecnologias pouco utilizadas na região à época, como nos dias de hoje.

O SK-105 é um carro de combate para apenas três tripulantes, extremamente compacto…

Já contabilizando mais de 20 anos de emprego e em um ambiente muito inóspito pela salinidade, os SK estão bastante desgastados. O fato de serem do último lote produzido resulta em uma grande dificuldade para se obter peças de reposição adequadas, aumentando o nível de indisponibilidade e os custos de manutenção. O CFN procura conservar, ao menos, quatro em condições operacionais. Uma atualização foi proposta pela empresa brasileira GESPI Indústria e Comércio de Equipamentos Aeronáuticos Ltda, que chegou a executar os trabalhos em um exemplar, sem custos para a Força. Todavia, não foi considerada vantajosa e o projeto acabou abandonado.

Com essas dificuldades todas, o Programa Estratégico PROADSUMUS, prevê a substituição dos SK-105. O problema, no entanto, se repete. Não existe uma viatura sobre lagartas que se adapte aos navios disponíveis na Marinha do Brasil, o que pode levar à reintrodução de blindados sobre rodas, como está acontecendo com os Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (US Marines Corps), que estão trocando os pesados Abrams por veículos de maior mobilidade, apesar de existir muita resistência a essa visão, lá ou aqui. Outra possibilidade seria esperar pela próxima geração de “médium main battle tank” (MMBT), algo que pode levar mais tempo que a vida útil das viaturas atuais, ou então trocar os meios navais de desembarque!

Ou seja, se não fosse a questão logística, seria totalmente inapropriado se considerar o SK-105 A2S obsoleto, principalmente se levado em conta a natureza da missão e o teatro de operações regional onde é usado.

E a “fumaça preta”? Bem, motores a diesel, notadamente os mais velhos, exigem regulagens constantes e, dependendo de como for feita, terão maior ou menor potência. Como as viaturas que participaram do “desfile” estavam configuradas para uma manobra que simularia uma situação de combate real, foi evidenciado o desempenho dos SK-105 não havendo muita preocupação com a fumaça que seus motores iriam emitir. Simples assim…

… e leve, permitindo que seja transportado aos pares nas embarcações de desembarque de viaturas militares (EDVM), da Marinha

Fotos: Paulo Bastos / Operação Formosa 2021




Artigo publicado originalmente na edição 164 da revista Tecnologia & Defesa, de setembro de 2021

COMPARTILHE

Respostas de 6

  1. Servi no 1° Batalhão de Fuzileiros Navais, Batalhão Riachuelo entre 2001 e 2002. Vi a chegada destes tanques, as manobras, a preparação e outros tantos treinamentos que aconteciam no Complexo Naval da Ilha do Governador. A tropa ficou com moral elevada e alegre com a chegada dos blindados novos. Desejo sucesso na busca pelo novo substituto e que o nosso Corpo de Fuzileiros Navais composto por seus homens e mulheres tenham dias de glória. ADSUMUS!

  2. tive o prazer de receber e realizar os primeiros cursos pois servia em 1996 na CiaCC como comandante de carro de combate Cascavel foi um salto enorme em termo de conhecimento pois o sistema do Cascavel era todo manual

  3. A OIP na Bélgica (é uma empresa israelense na verdade) tem um pátio cheio de A2 (mais de 100 unidades), mas acho que eles não vendem por peça, parece que só o pacote completo. Graças a Deus, porque senão a Marinha ia demorar mais ainda pra trocar e esses guerreiros já precisam aposentar, toda máquina precisa de descanso um dia, não é possível.

  4. Questões sobre a mídia, a parte, não considero nenhum veículo blindado como descartável, embora o uso para o que foi destinado, esteja superado, ainda pode servir, se atualizado como apoio a infantaria.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *