O contingenciamento de recursos e corte de verbas nos programas estratégicos de defesa da Marinha do Brasil têm obrigado as empresas do setor a renegociar contratos e prazos de pagamentos. Os impactos também incluem a suspensão de alguns projetos e a demissão de mão de obra.
O Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB), por exemplo, sofreu um corte de 41% no orçamento deste ano. Houve redução do ritmo das obras do estaleiro de construção e paralisação das obras do estaleiro de manutenção e da base naval, que estão sendo feitas pela Construtora Norberto Odebrecht.
O comandante da Marinha, almirante-de-esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira, confirmou que 1.200 empregados que trabalhavam nessas obras foram demitidos até setembro, 36% do total. O PROSUB, segundo a Marinha, tem R$ 1 bilhão alocados para 2015. O valor total do programa é de R$ 31,85 bilhões, dos quais R$ 13,34 bilhões já foram gastos até o momento.
“Os contratos públicos necessitam de previsão orçamentária. Como a arrecadação caiu muito, somos obrigados a sentar com as empresas e rever cronogramas físicos e financeiros para que se adaptem à realidade orçamentária atual”, disse o diretor do Departamento de Produtos de Defesa (DEPROD), do Ministério da Defesa, brigadeiro-do-ar José Augusto Crepaldi Affonso.
No caso dos submarinos, segundo o brigadeiro, existe de fato um atraso na execução dos contratos, mas as empresas parceiras tem procurado manter o processo de transferência de tecnologia em andamento para não perder o time da absorção tecnológica.
A mesma estratégia a Marinha tem tentado aplicar no seu programa nuclear, no projeto de construção do reator do futuro submarino nuclear. A parte mais complexa, seu sistema de controle, está a cargo da Atech, uma empresa controlada da EMBRAER Defesa & Segurança. O diretor do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP), contra-almirante André Luis Ferreira Marques, disse que parte dos 20 especialistas envolvidos no desenvolvimento do reator está sendo desmobilizada devido à redução de recursos para o projeto.
A previsão, segundo ele, é que a construção do reator sofra atraso de quatro a cinco anos em relação ao prazo inicial que previa que ela fosse concluída em 2018. O desenvolvimento tem custo estimado entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões, sendo que R$ 1 bilhão já foi investido. “Vamos transferir parte dessa mão de obra da Atech para a Amazul (Amazônia Azul Tecnologias de Defesa S.A), empresa controlada pela Marinha, para garantir que o desenvolvimento da tecnologia mais crítica não seja afetado”, disse o diretor presidente da empresa Ney Zanella dos Santos.
O comandante da Marinha disse que o programa nuclear tem previsão de recursos da ordem de R$ 250 milhões neste ano, sendo que há necessidade de R$ 320 milhões para que os projetos de capacitação, como o do reator, possam ser cumpridos conforme o planejado. “Em 2016 teremos R$ 250 milhões novamente. Isso não nos permitirá avançarna velocidade desejada”, afirmou o almirante.
O programa emprega hoje três mil pessoas no Centro Experimental Aramar (CEA), em Iperó (SP). De acordo com o almirante, 200 pessoas serão desligadas entre 2015 e 2016.
O presidente da Odebrecht Defesa e Tecnologia (ODT), André Amaro, disse que as atividades relacionadas à construção dos submarinos do PROSUB (quatro convencionais e um nuclear) prosseguem, mas que a apreensão é enorme, pois o montante em atraso está atingindo níveis insustentáveis.
A construção dos submarinos é coordenada pela Itaguaí Construções Navais (ICN), formada pela ODT e pela francesa DCNS, responsável por transferir a tecnologia ao Brasil. “Estamos priorizando atividades onde o impacto sobre o prazo e perdas de investimentos em transferência de tecnologia seja o menor possível”, disse Amaro. Na construção do Estaleiro e Base Naval, mais de 600 empresas locais prestam serviços e fornecem materiais, equipamentos e insumos.
A construção dos submarinos convencionais, de acordo com a Marinha, envolve 104 projetos de nacionalização, dos quais 56 são considerados prioritários. Nove engenheiros da Fundação Ezute, de São Paulo, participaram de um programa de treinamento e absorção de tecnologia durante três anos nas instalações da DCNS, na França. A Ezute fornece o sistema de combate dos submarinos.
“O sistema é um dos mais estratégicos do programa, pois abre frente para reaplicar esse conhecimento no futuro, na sua nacionalização e em outros submarinos da Marinha”, disse, Tarcísio Takashi Muta, presidente da Ezute.
Ivan Plavetz
Fonte: Valor Econômico