Opinião – Porta-aviões, um bom problema

Por Rogério Miccuci, Aviador Naval da reserva da MB

Como sempre diz um amigo executivo de uma empresa nacional da área de defesa, ao se referir a negócios: “traga-me um problema; eu prefiro ter problemas a resolver, do que não ter um contrato e seus problemas.”

Daí minha correlação: uma Marinha que tem um porta-aviões tem um bom problema. Pior seria se não o tivesse (vide a derrocada da Armada Argentina (ARA) após dar baixa no seu 25 de Mayo).

O Brasil, face às restrições orçamentárias impostas à Marinha do Brasil (MB), vive um dilema nos dias de hoje: abolir o emprego de um porta-aviões? Modernizar o A-12 São Paulo? Ou encomendar a construção de um novo porta-aviões? Ou, ainda, dar baixa no navio capitania de sua Esquadra e comprar um porta-aviões usado por oportunidade?

A título de ilustração, abaixo tem-se uma ideia dos custos de construção de um porta-aviões.

  • Gerald R Ford – US$ 13.5 bilhões
  • George HW Bush – US$  6.26 bilhões
  • Queen Elizabeth (UK) – US$ 3.7 bilhões
  • Charles de Gaulle (France) – US$ 3.7 bilhões
  • Cavour CVH (Italy) – US$ 2 bilhões
  • Hyuga DDH (Japan) – US$ 1.06 bilhões
  • Vikrant (India) – US$ 762 milhões

Cabe ressaltar que os menores custos de aquisição estão relacionados aos porta-aviões de operação VSTOL (Vertical or Short Takeoff and Landing), apresentando custos mais elevados os de operação CTOL (Conventional Takeoff and Landing, estes dotados obrigatoriamente de catapultas e aparelho de parada). A MB opera os porta-aviões CTOL, desde o navio-aeródromo ligeiro Minas Gerais – A11, incorporado à Armada em 1960. Este modo de operação requer um longo período de treinamento das tripulações envolvidas para atingir-se a eficiência operacional segura.

Conforme descrito na Estratégia Nacional de Defesa (END), onde são elencados os principais objetivos da defesa, destaco para a análise desse assunto os seguintes:

  • defender os interesses nacionais, as pessoas, os bens e os recursos brasileiros no exterior;
  • contribuir para a estabilidade regional;
  • contribuir para a manutenção da paz e da segurança in­ternacionais;
  • intensificar a projeção do Brasil no concerto das na­ções e sua maior inserção em processos decisórios interna­cionais;
  • estruturar as Forças Armadas em torno de capacidades, dotando-as de pessoal e material compatíveis com os plane­jamentos estratégicos e operacionais;

Além disso, conforme amplamente debatido em diversos fóruns (como no excelente artigo do CMG – CA-RM1) Vinícius Castro, em que ele discorre sobre o navio-aeródromo, seu emprego e o caso brasileiro a luz das tarefas básicas do Poder Naval), um país com as aspirações do Brasil no cenário internacional vê-se obrigado a ter uma Esquadra forte e bem equipada, nucleada em um porta-aviões, para atingir seus objetivos estratégicos; caso contrário, corre-se o risco de:

  1. não cumprir os objetivos de defesa quando da necessidade real de efetivo emprego das Forças Armadas (vide o conflito das Malvinas ou Falklands, onde a Royal Navy, sem a previsão de um conflito a curto prazo, havia dado baixa em suas aeronaves de alarme aéreo antecipado (AEW), e, surpreendida pela ação argentina teve que improvisar e desenvolver tempestivamente a aeronave SeaKing com o referido sistema; do mesmo modo a ARA, face a reduzida capacidade operacional de seu porta-aviões e escoltas, que sequer suspenderam dos portos devido `a ameaça de um submarino nuclear inglês no teatro de operações marítimo e, aliado a esse fato, a inexistência de uma aeronave reabastecedora tipo AAR (air-to-air refueling, como as futuras aeronaves KC-2 Turbo Trader recém adquiridas pela MB junto à US Navy e ora em fase de modernização), teve a ARA que lançar mão de vagas aéreas a partir de terra com suas aeronaves Super Étendard armadas, missões essas que se assemelharam às kamikaze japonesas da Segunda Guerra Mundial. Como já dizia Rui Barbosa “Esquadras não se improvisam”;
  2. tornar-se um ator de pouca relevância no cenário internacional. Aliás, como sempre é propagado pelos Estados Unidos em suas campanhas midiáticas: “porta-aviões, 90.000 toneladas de diplomacia”.

Voltando ao dilema brasileiro, todas as perguntas têm soluções exequíveis de serem adotadas: abolir o emprego de um porta-aviões vai de encontro à consecução dos princípios de defesa acima elencados e descritos nos diversos documentos condicionantes, como o Plano Estratégico da Marinha (PEM) e o Plano de Articulação e Equipamento da Marinha (PAEMB); a modernização do A12 requer aproximadamente quatro anos após tomada a decisão; a aquisição de um novo porta-aviões demanda pelo menos cinco anos após a assinatura do contrato com um estaleiro, desde que haja um estaleiro disponível para um encomenda dessa envergadura; uma aquisição por oportunidade de um porta-aviões CTOL de propulsão convencional, (modo de operação a ser mantido em função da escolha pela Força Aérea do caça sueco Gripen NG o que, por comunalidade operacional entre as duas aviações, implicará na adoção pela MB do futuro caça naval Sea Gripen NG), recai sobre uma única alternativa viável no momento: o USS John F. Kennedy (CV 67), de aproximadamente 80 mil toneladas, descomissionado em 2007.

Portanto, a solução dependerá do grau de comprometimento do estado brasileiro com a área de defesa e no estado de prontidão que o Brasil deseja para emprego de sua Marinha a curto, médio e longo prazos. Ter um porta-aviões ainda é um bom problema para o Brasil!

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