Natural do Rio de Janeiro, ex-comandante da corveta Júlio de Noronha (V32) e ex-diretor da Escola de Guerra Naval e de Hidrografia e Navegação, o almirante-de-esquadra Edgar Luiz Siqueira Barbosa é atualmente o Diretor-Geral do Material da Marinha e tem um enorme desafio, em um quadro de grave restrições financeiras, de conduzir, entre outras missões, as ações necessárias ao preparo para a aplicação do Poder Naval e implementação dos programas da Esquadra.
Para esclarecer uma série de questões levantadas pelos leitores de Tecnologia & Defesa, ele gentilmente concedeu uma entrevista exclusiva a Paulo Maia.
Tecnologia & Defesa – A corveta Barroso tem demonstrado, ao longo dos anos, em comissões nos oceanos Atlântico, Pacifico e Índico e no mar Mediterrâneo, a capacidade da construção naval brasileira e a qualidade e profissionalismo de suas tripulações. No momento, este navio se encontra em Período de Manutenção Geral (PMG). Considerando este fato, quais são as obras em andamento e previstas e qual é a previsão de tempo de serviço para a Barroso?
Almirante-de-Esquadra Edgar Luiz Siqueira Barbosa– Incorporada à Marinha do Brasil (MB) em 2008, a corveta Barroso, após intenso período operativo, iniciou o respectivo PMG no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ), cujo escopo principal abrange revisões ou substituições na plataforma (sistema de propulsão, linhas de eixo, hélices de passo controlável, pés de galinha, geração e distribuição de energia elétrica, sistema de condicionamento de ar, compressores de ar de alta pressão, dessalinizador, sistema frigorífico, chapeamento e pintura das obras mortas e vivas), bem como do sistema de combate (canhão 4.5”, sistema lançador de torpedos, alça optrônica, míssil superfície-superfície, sonar, radares, entre outros). Tal período demandou duas etapas de docagem do navio, com o principal objetivo de manter a capacidade, confiabilidade e disponibilidade por mais um período operativo, ou seja, até 2033, visando dotar a Força de Intervenção de um meio aprestado para situações de crise e conflito.
T&D – Quais as principais obras que estão sendo planejadas para a revitalização, modernização e extensão da vida útil do navio-escola Brasil e do navio-tanque Gastão Motta? Após a realização das mesmas, quantos anos se espera que cada um continue em operação?
Almirante Edgar – O navio-escola Brasilse prepara para a realização da 38a Viagem de Instrução de Guardas-Marinha em 2024 e, além do período de manutenção que antecede uma longa comissão, realiza, paralelamente e de forma fracionada, atividades específicas de extensão da vida útil do navio, principalmente de integridade estrutural. Além disso, em 2026 serão iniciadas revisões gerais dos motores de propulsão. Atualmente, o navio-tanque Almirante Gastão Motta realiza revitalização e modernização que, em primeiro momento, abrangem um período de docagem para recuperação estrutural (tanques de colisão AV e AR, válvulas de fundo, trechos de redes diversos e sistema de proteção catódica), além de alguns itens do sistema de propulsão (linha de eixo, hélice de passo controlado e engrenagem redutora). Em um segundo momento, está prevista a revitalização do sistema de transferência de óleo no mar. Após a realização dessas obras específicas, a expectativa é que os navios ampliem sua vida útil por mais 10 anos.
T&D– Quais são as obras previstas no projeto de modernização e revitalização do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ)? Concluído este projeto, quais são as Classes de navios que deverão ser construídas neste importante estabelecimento industrial naval?
Almirante Edgar – O projeto de modernização e revitalização do AMRJ, conhecido como PROESTRUTURA, é uma iniciativa setorial que visa adequar e ampliar a capacidade de construção e manutenção de meios navais, bem como incorporar boas práticas de gestão industrial.
Suas metas englobam:
a) Modernização de oficinas do departamento de produção, entre elas a de manutenção de navios de superfície;
b) Revitalização dos diques Almirante Régis; Almirante Jardim e Santa Cruz; e
c) Melhorias no sistema de distribuição elétrica e nas subestações.
O edifício 17, onde no passado foram construídos os submarinos Classe Tupi e Tikuna, ficará vocacionado para construção de navios patrulha de até 500 toneladas (Classe Macaé e, eventualmente, NPa-500BR). No local, hoje encontra-se em execução o futuro navio-patrulha Mangaratiba. Já o edifício 4 permanecerá dedicado aos projetos de embarcações de pequeno e médio portes, como as lanchas de operação ribeirinhas em alumínio, que estão atualmente em construção.Por fim, pretende-se, através de parcerias estratégicas, adotar um modelo de negócios para investimentos e aperfeiçoamentos, tanto no edifício 19 quanto nas carreiras de navios, que possuem capacidades para construção de meios de grande deslocamento e dimensão, como os navios-patrulha oceânicos (NPaOc).
T&D – Qual é o planejamento para substituição dos navios-varredores da Classe Aratu e para a manutenção e ampliação das capacidades de guerra de minas da Marinha?
Almirante Edgar – Cabe uma consideração inicial sobre a questão, uma vez que sua temática não possui total aderência com a gestão da manutenção ou construção de meios do portfólio do AMRJ, temas de responsabilidade desta Diretoria-Geral, contudo, é importante incluir os seguintes comentários.
O planejamento para a substituição dos navios-varredores da Classe Aratu e para a manutenção e ampliação das capacidades de guerra de minas da Marinha está em fase de desenvolvimento, sendo resultado dos estudos que abordaram a viabilidade da extensão da vida útil dos atuais meios ou suas eventuais substituições, inclusive com meios não tripulados, cada vez mais utilizados neste tipo de ação (vide o USV Suppressor,embarcação em desenvolvimento com a parceria Emgepron/TideWise – ver T&D 173). O Programa de Obtenção de Navios Patrulha (ProNaPa), que promoverá o detalhamento e construção do NPa500BR, prevê que alguns dos meios sejam adaptados para versão guerra de minas, sendo uma das possibilidades na análise de substituição dos atuais meios.
Uma das possibilidades estudadas, que muitas outras Marinhas também estão considerando, é a utilização de tecnologias de contramedidas de minagem a partir de embarcações não tripuladas, controladas por um “navio-mãe” ou por terra. Este navio-mãe, também ainda em fase de estudo, poderia ser, entre as opções vislumbradas, o navio-patrulha de 500ton (de projeto nacional), após as modificações necessárias. A possibilidade da obtenção de um ou mais navios dedicados exclusivamente à caça de minas ainda não foi descartada. Os NPa 500BR vão operar como navio-mãe de USV para a guerra de minas.
T&D – Realizada a integração dos blocos componentes do navio-patrulha Mangaratiba, quais são as próximas etapas para a conclusão das obras e quando o mesmo deverá ser incorporado?
Almirante Edgar – Após a integração dos blocos do casco do navio-patrulha (NPa) Mangaratiba, já concluída, as próximas etapas, planejadas ainda para o corrente ano, envolvem a realização de serviços e aquisições a fim de dar prosseguimento às atividades de acabamento de diversos sistemas, dentre os quais se destacam: propulsão, eletricidade, sistemas de armas… etc. Com a conclusão desta etapa, inicia-se a fase de integração e comissionamento desses sistemas, de modo que o navio seja lançado ao mar em meados de 2025 e, em seguida, seja submetido aos testes de cais e de mar, tornando o NPa Mangaratiba pronto para incorporação ao Setor Operativo da MB ao final do mesmo ano. Assim, será possível a realização das fases finais de qualificação da tripulação e posterior destinação do navio para sua sede definitiva.
T&D– Existe a previsão de construção de mais navios da Classe Macaé ou a mesma será encerrada com a entrega do Mangaratiba?
Almirante Edgar – O NPaMangaratiba será o quarto navio da Classe Macaé e o segundo a ser construído pelo AMRJ, permitindo a manutenção e o fomento da capacidade de construção naval no País. A MB possui mais duas licenças disponíveis para a construção de navios-patrulha Classe Macaé, bem como alguns equipamentos já adquiridos para tais meios em face de contratos anteriores não finalizados. Dentro do ProNaPa, que contará, a partir de 2024, com recursos oriundos do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), a prioridade será pelos NPa-500BR, projeto nacional e de grande flexibilidade e versatilidade.Contudo, está em análise a coexistência de construção entre esses meios, o que levaria a MB a exercer sua opção de licença. Neste caso, ou seja, optando por outras unidades dos NPa Classe Macaé, o AMRJ assumirá tal processo construtivo, aproveitando a infraestrutura do edifício 17, o projeto detalhado do navio, bem como o conhecimento armazenado nestes últimos anos com a construção de dois desses meios.
T&D – O detalhamento final do projeto da nova Classe de navios patrulha de 500 toneladas, o NPa 500 BR, já foi concluído? Foi estabelecido um cronograma preliminar de incorporação dos quatro navios a serem construídos até o ano de 2030?
Almirante Edgar – O Projeto de detalhamento do navio já foi iniciado pelo Centro de Projetos de Sistemas Navais (CPSN), organização militar subordinada à Diretoria-Geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha. O cronograma de construção vem sendo tema de sucessivas reuniões entre diversos atores do Setor do Material da Marinha, da Emgepron e do CPSN, visando ao seu estabelecimento e aprovação final.
T&D – A imprensa vem noticiando a retirada de serviço de várias Classes de navios da Royal Navy. A MB está analisando a possibilidade de aquisição por oportunidade de algum desses navios?
Almirante Edgard – No momento, não há tratativas para obtenção de navios provenientes da Royal Navy, mas tal possibilidade não está descartada.
T&D– Qual a perspectiva objetiva de serem construídas, no final desta década ou início da próxima, unidades adicionais das fragatas da Classe Tamandaré?
Almirante Edgar – Tendo em vista o compromisso da Marinha com o cumprimento do seu Plano Estratégico, que visa à modernização do Poder Naval, a construção de unidades adicionais de fragatas Classe Tamandaré (FCT) é uma possibilidade. A crescente necessidade de meios navais para atender às demandas da Amazônia Azul e das nossas águas interiores é uma realidade, não afastando a MB da expectativa de obtenção de outras fragatas a serem construídas no início da próxima década, após a entrega da 4ª FCT, prevista para ocorrer em 2029.
N.da R.: Tecnologia & Defesa agradece ao almirante-de-esquadra Edgar Luiz Siqueira Barbosa e à assessora de Comunicação Social da DGMM capitão-tenente Sabrina Aragão Victer, pelo apoio prestado para a realização desta entrevista.
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Respostas de 4
Triste o quadro da MB! A construção de novas fragatas é apenas uma possibilidade… o planejamento deveria ser imediato.
o planejamento marinha tem,o que falta e a verba para execução !!!
O grande problema da Barroso é a ausência de um sistema de defesa aérea, mesmo que de ponto. Mesmo que fosse um dos sistemas Simbad/Mistral que a MB já aventou em colocar no São Paulo e depois no Atlântico (e não fez em nenhum deles). Um navio de escolta, que é o que a Barroso é, nos dias atuais não possuir nenhuma defesa antiaérea missilística é um total absurdo.
Infelizmente a MB está cada vez mais no buraco. Oficialidade omissa, que se preocupa apenas com suas promoções. Curso para manter os praças no cabresto. Navios ultrapassados e uma esquadra cada vez menor. A Barroso foi bem planejada, mas aí vem o CAAML, com uma doutrina dos anos 70, e força a modificar um navio com várias automatizadores, forçando a aumentar a tripulação em nome do CAV, gerando desconforto para os praças. Um banheiro que fica em cima da cozinha, que quando da problema na rede de esgoto sanitário, tem que isolar a cozinha e a tripulação fica sem comida quente. Vou parar por aqui, senão escreverei uma epopéia dos erros da MB.