Informação e inteligência aplicadas aos processos decisórios em incidentes críticos – Parte 1/4

Por Valmor Saraiva Racorti (*)

RESUMO

O presente artigo faz uma análise da importância do uso adequado da Informação e da Inteligência como ferramentas táticas no gerenciamento de incidentes críticos, de modo a permitir o funcionamento de um Sistema de Comando e Controle, com tecnologia e integração, a fim de fornecer um foco para que indivíduos e organizações possam integrar e maximizar seus meios e atividades, alcançando assim os objetivos desejados: preservar vidas e otimizar recursos.

1 – INTRODUÇÃO

O Sistema Nacional de Gerenciamento de Incidentes (SNGI) que está sendo proposto pelo Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Estado de São Paulo à Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) representa um conjunto básico de doutrina, conceitos, princípios, terminologia e processos organizacionais que permitem o gerenciamento eficaz, eficiente e colaborativo de incidentes críticos.

Um incidente crítico (…) é qualquer evento que coloque em risco, cause danos graves a patrimônio ou meio ambiente, cause impacto significativo na confiança da sociedade e, por conseguinte, na sensação de segurança, exigindo resposta célere e integrada de diversos órgãos e instituições com emprego conjugado de meios de gestão estratégica para a resolução [RACORTI, 2019, p. 97].

O Sistema de Comando de Incidentes (SCI), como um componente do SNGI, estabelece uma estrutura operacional consistente que permite ao governo, setor privado e organizações não governamentais trabalharem juntos para gerenciar incidentes, independentemente da causa, tamanho, localização ou complexidade. Essa consistência fornece a base para o uso do SCI em todos os incidentes, desde ocorrências diárias até aqueles que exijam uma resposta municipal, estadual e federal coordenada.

Muitos incidentes, desastres naturais ou acidentes, têm uma causa e origem óbvias. No entanto, outros incidentes críticos, como incêndios em grande escala, emergências de saúde pública, explosões, de transporte (descarrilamentos de trens, quedas de aviões, colapsos de pontes, entre outros), atiradores ativos, ataques terroristas criminais ou outros incidentes que causam lesões em massa ou fatalidades, necessitam de um componente de inteligência ou investigativo para determinar sua causa e origem.

Estrutura do Sistema de Comando de Incidentes. Elaborado pelo Autor

A padronização, flexibilidade e gestão de esforço das instituições permitem que a “função de Inteligência” seja perfeitamente integrada com as outras funções do SCI, possibilitando uma integração de inteligência e coleta, análise e compartilhamento de informações, bem como investigações que identificam a causa e a origem de um incidente e até antecipando o evento, independentemente da fonte.

Estudos relativos à busca por melhores resultados em incidentes críticos exigem uma análise que englobe fatores preponderantes como o tratamento das informações e a aplicação assertiva da inteligência (aqui compreendida como processo de tratamento das informações e seu uso adequado nos processos decisórios), de modo a permitir uma melhor compreensão e o insight para atuação, estabelecendo uma base mais sólida para formular estratégias e planos que possibilitem soluções eficazes e eficientes.

O componente de inteligência é responsável pela coleta, registro, avaliação e disseminação de todas as informações pertinentes relacionadas a um incidente e requer a avaliação contínua de todos esses dados e no impacto destes na operação geral. Não se pode desconsiderar, no entanto, que essa inteligência técnica depende muito da intuição, engenhosidade e experiência da equipe, cujo foco deve ser evitar buscas ineficazes e outros esforços improdutivos, permitindo discernir a relevância e a importância de uma mistura de dados aleatórios.

Assim, é necessário realizar uma abordagem metódica e lógica, não apenas para garantir que o produto seja confiável, mas que esteja disponível a tempo de ser incorporado ao planejamento e à tomada de decisão.

Para os fins deste artigo, as informações e inteligência devem ser interpretadas de forma ampla para apoiar as necessidades do usuário em todos os ambientes de ameaças e perigos, de modo a permear todos os momentos do incidente; a prevenção, proteção, resposta (em tempo real), recuperação e mitigação de riscos, independentemente da causa, tamanho, localização ou complexidade.

 2- INFORMAÇÃO E INTELIGÊNCIA

Dois termos, frequentemente usados de forma intercambiável, mas com significados distintos em situações táticas, informações são descritas como o conhecimento ou as notícias de um evento ou situação obtidos através da coleta de fatos ou dados, por outro lado, a inteligência é o tratamento de uma informação específica relacionada à situação em questão. A inteligência geralmente ocorre com a “fusão” de informações. Isso significa reunir partes e diferentes detalhes e fatos e combiná-los, de modo a obter uma imagem mais completa da situação em questão.

Portanto, as informações podem ser melhor entendidas como “dados brutos”, enquanto a inteligência como “dados processados”.

O termo “inteligência” refere-se não apenas ao produto, mas essencialmente ao processo. Uma inteligência completa nunca é possível; ela reflete tudo o que é conhecido até o momento em que é apresentado, consequentemente, os esforços para obter informações confiáveis, relevantes e oportunas continuam durante toda a parte tática de uma operação em incidentes críticos e, mesmo depois de concluída, as lições aprendidas de uma operação lançam as bases para o próximo evento.

2.1 – As espécies de informação

De um modo geral, existem quatro tipos de informação:

  • Informação arquivística é aquela que raramente muda. Por exemplo, todos os dados históricos são de natureza arquivística, ou ainda incluem coisas como nomes de características e endereço do local do incidente, nome dos envolvidos e assim por diante.
  • Informação enciclopédica: são duráveis, mas não permanentes, como números de telefones, locais de trabalho ou proprietários de veículos.
  • Informação atual: são sensíveis ao tempo e perenes. Eventos ou ações que ocorrem no presente ou no passado muito próximo, tais como condições meteorológicas e de iluminação. As informações atuais também têm um subconjunto chamado “informações dinâmicas” que estão em um estado quase constante de mudança, como a localização precisa dos respondedores, o tempo que eles trabalharam ou a quantidade de combustível em um veículo em movimento, entre outras.
  • Informações futuras: são as informações que podem ser derivadas de previsões ou projeções. As informações futuras são essenciais para o planejamento, estimativa de impacto e designação de pessoal e recursos, e não raramente é o tipo mais negligenciado.

Todos os planos são um tipo de informação futura, porque todo o planejamento tenta alterar um futuro. Outros exemplos incluem previsões do tempo, consumo de combustível, fadiga, horários estimados de chegada e eventos programados.

Embora todos os quatro tipos de informações sejam críticos no planejamento e preparação de operações táticas e respostas de emergência, é importante observar que informações arquivísticas e enciclopédicas podem ser coletadas e armazenadas para uso posterior, mas as informações atuais e futuras são de “alta manutenção” e requerem aquisição e interpretação contínuas.

Isso tem implicações importantes, pois um gestor de um incidente que tem a previsão de reunir e armazenar informações arquivísticas e enciclopédicas úteis, ganha tempo e recursos para se concentrar nos outros tipos, quando necessário.

 

(*) Tenente-coronel da Polícia Militar do Estado de São Paulo, trabalhando atualmente como Comandante do Batalhão de Operações Especiais da PMESP (COE/GATE) / Doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pelo Centro de Altos Estudos da Polícia Militar. Bacharel em Direito pela Universidade Cruzeiro do Sul.

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Comentários

3 respostas

  1. Excelente publicação!
    Comandante Ten.Coronel Racorti, tem minha admiração não somente pelo excelente desempenho em Incidentes Críticos de alta complexidades, como também pelo constante estudo que faz sobre o referido assunto, possibilitando aos demais profissionais da área o compartilhamento de conhecimento e experiência. Parabéns! Sucesso

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