Brasil-Índia, um Diálogo de Indústrias Navais

O evento “Brasil-Índia um diálogo de Indústrias Navais” foi realizado no último dia 2 de maio no SINAVAL (Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore), no Rio.

Na ocasião, o estaleiro indiano Goa Shipyard Ltd, na pessoa do seu Chairman e Managing Director, almirante Shekhar Mittal apresentou aos associados a sua visão para uma parceria continuada entre a indústria da naval indiana e sua congênere brasileira.

Para Mittal, existem grandes oportunidades para os dois países atuarem conjuntamente, tanto no mercado brasileiro, como no mercado sul americano e no Indiano. “A relação que o GSL pretende com o Brasil é uma de longo prazo, uma que apenas se inicia com o contrato das corvetas para a Marinha do Brasil.” Diferente de outros estaleiros estrangeiros, o Goa Shipyard não tem intenção de operar um estaleiro próprio no país, mas de trabalhar lado a lado com os estaleiros nacionais. “A ‘estrada’ que estamos abrindo aqui, entre as indústrias dos dois países, trafegará igualmente nas duas direções. Produtos e serviços de alto valor agregado virão da Índia para o Brasil e também daqui para lá,” disse o almirante Mittal.

A demonstração do Goa Shipyard apresentou as razões, segundo os indianos, de porque a Índia é atualmente o país ideal para cooperar com o Brasil no mundo da construção naval.

Segundo o almirante Mittal, o País asiático é, como o Brasil, uma nação em desenvolvimento cujo Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 31% de 2013 a 2017. No mesmo período o PIB global cresceu apenas 4%.

Fatores como este justificam as expectativas de que já em 2030 a Índia alcançará a posição de terceira maior economia do planeta. Uma tabela do grupo de consultoria multinacional Delloite Global apresentada por Mittal mostra que a Índia em 2020 deverá ocupar a 5ª posição no ranking dos países mais competitivos na área de manufatura. Em 2016 a Índia ocupava apenas a 11ª posição deste ranking.

Falando de potencial da mão de obra indiana o CMD do Goa Shipyard mostrou que a jovem população indiana total deve saltar de 1,311 Bilhões para 1,706 no ano de 2050. No mesmo período a população em idade laboral deve crescer 33%, saltando de 860 milhões para 1,145 bilhões, o que garante às industrias/empresas indianas uma farta oferta de pessoal.

Sobre as oportunidade para o crescimento da Indústria naval indiana, o almirante citou os 12 portos principais e os 200 portos médios e pequenos ao longo da costa de 7.500 km do seu país.

Mittal mostrou a tendência de crescimento continuado do orçamento da Marinha indiana de US$35 bilhões em 2011 para cerca de US$ 80 bilhões em 2021. Mais surpreendente ainda, especialmente quando comparada à situação do Brasil, cerca da metade destes valores serão destinados à aquisição de novos meios (“capital expenditure”).

Salientando dramaticamente a diferença entre as políticas do governo indiano e brasileiro, Mittal mostrou que neste momento existem 120 navios em construção na indústria indiana para a Marinha e Guarda Costeira da Índia (num total de US$ 20 bilhões). Segundo ele, já é previsto contratações orçadas em cerca de US$ 127 bilhões, destinadas aos estaleiros indianos durante os próximos 15 anos.

Com a conclusão desses projetos a Marinha da Índia crescerá de 135 navios para 200 até 2027. Por sua vez, a Guarda Costeira deve sair dos atuais 75 para 150 navios até 2022. Os principais estaleiros indianos pertencem ao governo e são administrados pelo Ministério da Defesa.

Além do GSL existem o Mazagon Dock, o Cochin Shipyard, o Garden Reach e o Hindustan Shipyard. Os estaleiros privados indianos só agora estão começando a entrar no segmento de navios militares.

A maior especialidade atual do Goa Shipyard são os navios de porte mediano como Navios Patrulha Oceânico (NPaOc ou OPV) e as corvetas. Não coincidentemente, este é justo o porte de navio que a Marinha do Brasil do Brasil busca na atual concorrência.

O portfólio do estaleiro Goa inclui diversas lanchas rápidas e lança mísseis de uso militar e/ou policial (“homeland security”) além de navios veleiros de treinamento e diversos tipos de simuladores em terra usados para a formação de marinheiros.

A indústria da construção naval indiana se apoia numa série de empresas estatais de alta tecnologia como a Bharat Electronics Ltd. (BEL), a Bharat Heavy Electrics Ltd. (BHEL), Bharat Dynamics (BDL) e a Ordnance Factories Board (OFB).

A BEL fabrica todo tipo de sistema eletrônico militar, de radares a rádios, passando por sistemas ópticos, datalinks e sistemas de combate de uso naval. Uma das mais importantes joint ventures da BEL é com a Thales européia. A BHEL fabrica sob licença para a marinha indiana os canhões italianos OTO Melara e a Bharat Dynamics fabrica diversos modelos de mísseis para as três forças armadas indianas.

O OFB, por sua vez, constrói localmente carros de combate e diversos modelos de blindados, além de munição de diversos calibres e fuzis de assalto.

Este conjunto de empresas especializadas garante a independência tecnológica da Índia, minimizando sua exposição a potenciais bloqueios e embargos estrangeiros de material militar.

Dentro da linha de substituição de importações, o governo Indianos lançou o programa “Make in India” visando aumentar o percentual da fabricação local, desenvolver a inovação, promover o desenvolvimento de novas capacidades industriais e capacitações, proteger a propriedade intelectual e construir fabricas que seja “best in class”.

Complementarmente, várias mudanças regulatórias foram recentemente introduzidas que desregulamentam a indústria de defesa, abrindo a porta e estimulando a chegada de novas empresas privadas indianas e também de grandes grupos estrangeiros interessados em fabricar seus produtos na Índia.

Simultaneamente, passou-se a estimular fortemente a busca de mercados estrangeiros para exportação, razão do GSL estar neste momento prospectando e disputando negócios no Brasil.

Focando no seu estaleiro, o almirante Mittal falou das raízes portuguesas do GSL e da rápida expansão que ele sofreu nos últimos dez anos. Atravessando agora um importante ciclo de modernização, o GSL está se prepara para assumir novos desafios que o transformarão por completo. Entre estes se encontram as duas fragatas de 4000t da classe Teg (“1135.6” na Rússia), equipadas com o sistema de mísseis Brahmos, contratadas para a Marinha da Índia ao estaleiro GSL por US$ 2 bilhões.

Outros  doze modernos navios de contramedidas de minas foram contratados, um negócio orçado em US$ 5 bilhões. Foi necessário ampliar as instalações existentes no estaleiro, incluindo um novo edifício para a construção de cascos inteiriços de grandes dimensões totalmente feitos em material composto.

O Goa Shipyard Ltd. vem acumulando uma série de sucessos econômicos recentemente, como a triplicação entre 2013 a 2017 do seu valor total da produção (VoP). No mesmo período, o lucro da empresa saltou nada menos que três vezes, enquanto o percentual da margem operacional foi de 5,61% para 17,75% no mesmo período.

O GSL virou o maior estaleiro exportador de navios do subcontinente indiano. De 2014 até 2017 o valor das exportações do estaleiro Goa triplicou, em termos absolutos com cerca de 25% da receita do último ano fiscal vindo de contratos com outros países. O foco na melhoria da administração permitiu que o estaleiro exibisse uma expressiva melhora no que tange o cumprimento de prazos e orçamentos.

Nos últimos anos o GSL construiu e entregou quatro unidades do Naval Offshore Vessel (NOPV), deslocando 2300t, para a Marinha da Índia e outros dois desta classe para a marinha do vizinho Sri Lanka, com negociações em andamento em vários outros países. Este modelo de Navio de Patrulha Oceânico foi totalmente projetado pelo seu pessoal técnico interno.

O GSL é reconhecido como um Research & Development Unit pelo Governo da Índia, realizando pesquisa e desenvolvimento de uma variedade de plataformas além de integração de complexos sistemas de armas das mais diversas procedências.

Por dispor de um completo departamento interno dedicado a pesquisa e desenvolvimento (R&D), o estaleiro Goa vem se destacado no mercado asiático. Ter esta capacidade lhe permite usar seus técnicos para revisar e validar o projeto da nova corveta brasileira, tendo em vista ela ter nascido no Centro de Projeto de Navios (CPN) da Diretoria de Engenharia da Marinha do Brasil (DEN) e posteriormente ter sido refinado por outro estaleiro internacional antes mesmo de se iniciar sua construção.

Esta capacidade contribui bastante para reduzir o nível de risco inerente a qualquer novo projeto, como são as Corvetas Classe Tamandaré, reforçando a posição da Índia e especialmente do GSL como o melhor parceiro internacional para o Brasil neste setor no longo prazo. A capacidade de R&D do estaleiro é atestada tanto pelo Governo Indiano, quanto pela sua Marinha e seu Departamento de Defesa.

O Goa Shipyards Ltd. identificou significativas semelhanças filosóficas entre o programa de construção naval e de desenvolvimento da indústria de Defesa local da Marinha do Brasil com aquele da Marinha Indiana. Ambos os programas buscam assegurar às suas Marinhas um suprimento garantido e soberano de modernos meios navais e de seus sistemas e armas embarcados.

Brasil e Índia, nações recentemente combinados sob a sigla “BRICS”, compartilham entre si uma longa história com inúmeras raízes em comum. O Brasil inclusive tendo sido descoberto em 1500 por uma esquadra portuguesa destinada à Índia. Por cerca de 450 anos os enclaves de Goa, Damão e Diu  foram postos de troca, colônias, eventualmente  territórios ultramarinos portugueses sendo que em 1961 foram finalmente reanexados à Índia.

Adicionalmente ambas as marinhas foram profundamente influenciadas na sua formação pela cultura operacional da Royal Navy britânica. Mittal concluiu sua fala dizendo: No passado Índia e Brasil foram unidos pela história e pelo mar. No futuro, isso seguirá sendo assim.”

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