Em agosto de 2017 este jornalista publicou artigo de opinião em Tecnologia & Defesa onde recomendava a não aquisição do então HMS Ocean, elencando uma série de óbices para justificar tal linha de raciocínio.
Exatamente um ano depois, esse mesmo escriba, após desembarcar do PHM Atlântico no Rio de Janeiro durante sua viagem inaugural, pode e deve afirmar o seguinte: como é bom estar errado as vezes!
Prólogo
O Ex-HMS Ocean, agora rebatizado PHM Atlântico (ou A-140), sempre foi muito criticado pelos estudiosos devido a sua baixa velocidade máxima sustentável.
Outras tantas informações desabonadoras sobre o navio, insistentemente repassadas por fontes contaminadas em 2017 serviram apenas para mascarar, hoje se sabe, a verdadeira “batalha” travada pela Marinha do Brasil nos portos e gabinetes da Rainha naquela época: vencer a resistência de muitos setores dentro da Royal Navy declaradamente contrários a efetivação do negócio entre o Brasil e o Reino Unido envolvendo o navio.
Mesmo após o envio de mais de 300 brasileiros em grupos para a Inglaterra, onde receberam treinamentos específicos para trazerem o navio para a sua nova casa, a cidade do Rio de Janeiro, a resistência a sua venda continuou movimentando a agenda política do Governo Britânico.
Os treinamentos FOST (Flag Officer Sea Training) exigiram cada vez mais da tripulação brasileira.
Isso não abalou o profissionalismo das empresas envolvidas, como por exemplo, a Babcok Marine, responsável pela manutenção do Ocean nas duas décadas em que esteve a serviço da Rainha.
Prova disso foi a presença de um executivo da companhia a bordo do Atlântico durante a sua chegada ao Rio de Janeiro.
A Babcock Marine executou, como prime-contractor, todos os trabalhos realizados no A-140 no período de transição entre as duas Marinhas e espera manter essas responsabilidades junto ao seu novo operador.
O navio, incorporado à MB no dia 29 de junho, foi adquirido por £ 84 milhões e adaptado e reparado pelas companhias Babcock e a BAE Systems para posterior repasse a Marinha do Brasil.
Mantendo um gigante
Material logístico e suprimentos, ambos estocados em grande quantidade no hangar principal do navio (cobertos com redes de camuflagem), os relatos da tripulação sobre os intensos (e as vezes ríspidos) treinamentos FOST, o excelente aspecto marinheiro do PHM, mais a presença a bordo de um time de ingleses, responsáveis por repassar detalhes da operação do navio em rota para os brasileiros, deixaram uma certeza: a Marinha aprendeu bem a lição que a recente desativação do NAe São Paulo ensinou.
Com a motivação da tripulação em alta e evidente, mesmo após tantos meses de trabalho, é necessário fazer essa ressalva, a quantidade de tarefas, missões, responsabilidades e afazeres a bordo do PHM não demoveu nenhum tripulante da certeza sobre a importância do novo navio para o Brasil.
O Olho que tudo vê.
Um dos motivos mais evidentes da atual modernidade do PHM Atlântico fica montado em um mastro e gira de forma bem rápida.
De concepção 3D, o radar digital Artisan (Advanced Radar Target Indication Situational Awareness and Navigation) designado como Type 997, tem alcance de 200 km e provê controle de tráfego aéreo extensivo e identificação dos alvos, assim como a visualização tática a médio alcance.
Ele pode acompanhar mais de 900 alvos ao mesmo tempo e adquirir objetos do tamanho de bolas de tênis deslocando-se até três vezes a velocidade do som.
Esse “sangue-novo” em termos de sensores, maior bônus da reforma pelo qual o A-140 foi submetido entre 2012 a 2014, ampliou enormemente as capacidades operativas diuturnas com aeronaves de asas rotativas (razão de ser da embarcação) e aumentou exponencialmente a eficácia e eficiência do comando e controle de área que o navio pode exercer.
A aquisição desse radar também pavimentou o caminho para o próximo passo, a instalação de mísseis dotados com sistema de lançamento a frio/vertical e capazes de engajamento multialvos contra ameaças aéreas em baixas e médias altitudes (leia-se MBDA Sea Ceptor).
Opcionalmente, será sempre possível (e mais barato) instalar alguns reparos Simbad para mísseis Mistral, como visto no G-40 Bahia.
O navio já conta com canhões autônomos (4x 30 mm) comandados a partir do Centro de Operações de Combate e que podem ser operados manualmente em caso de emergência.
Comando & Controle, no ar e no mar
Os dois Centros mais importantes do A-140, o de Operações de Combate e o de Operações Anfíbias agregam, em sua organização, uma estreita e vital relação com as equipagens dos Esquadrões da Aviação Naval e Fuzileiros Navais que operam embarcados.
É responsabilidade do Atlântico, devido a sua característica de porta helicóptero, manter em seus quadros tripulantes qualificados operações aéreas.
Inicialmente, o A-140 está apto até o Nível de Operação III e Classe de Apoio 3, ou seja, pode manter duas aeronaves em operação simultânea, no período diurno e sob condições meteorológicas visuais.
Após mais uma série de cursos e treinamentos, o navio será capaz de lançar e recolher simultaneamente suas aeronaves a noite com emprego de visão noturna, entre outras habilidades a serem certificadas pela Aviação Naval.
No Centro de Operações de Combate, um chefe de operações aéreas controla todos os lançamentos e recolhimentos de helicópteros, suas missões e seus efetivos.
Destaque para o excelente aproveitamento das tripulações na Vistoria de Segurança de Aviação (VSA) realizada ao largo de Cabo Frio antes da chegada do A-140 ao Rio de Janeiro.
Na manhã do dia 23 de agosto, Dia do Aviador Naval, aconteceram os primeiros pousos de helicópteros da Força Aeronaval a bordo do PHM Atlântico.
Operaram a bordo os helicópteros UH-15 Super Cougar, SH-16 Sea Hawk e IH-6B Bell Jet Ranger III.
Para que fosse possível operações aéreas com segurança, a Diretoria de Aeronáutica da Marinha (DAerM), através do Serviço de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos da Marinha (SIPAAerM), concluiu e aprovou a VSA dinâmica do navio.
Nas operações anfíbias pelo mar, as lanchas de desembarque, do tipo LCVP (Landing Craft Vehicle/Personnel), na sua versão Mk 5, realizam o transporte de grupos de combate (GC) desde o navio até o local de desembarque/assalto anfíbio.
Dependendo do equipamento transportado, até 35 militares podem ser acomodados mais a tripulação composta por três homens.
Estas LCVP são lançadas e recolhidas por um sistema automático de turcos e possuem uma cobertura removível que protege os militares dos rigores do clima em regiões frias.
Por outro lado, no calor dos trópicos o emprego dessa cobertura torna o interior do habitáculo em um ambiente bem quente.
O navio até pode operar em conjunto com outros tipos de embarcações, porém sem oferecer a capacidade de doca alagável, essas não podem ser lançadas ou recebidas a bordo.
Complemetando a dotação do A-140, foi possível observar, entre as embarcações de bordo, um moderno bote/lancha semi-rígido Pacific de oito lugares, do tipo usado habitualmente por forças especiais.
Certamente, mergulhadores de combate (GRUMEC) e integrantes do Batalhão Tonelero serão “hóspedes” frequentes do navio quando este for ao mar com a Marinha do Brasil.
Reformas e melhorias
O PHM Atlântico é um navio relativamente novo. Construído em Clyde pelo estaleiro Kvaerner Govan, foi equipado em Barrow-in-Furness pelo Vickers Shipbuilders.
Sua quilha foi batida em 30 de maio de 1994, o lançamento ocorreu em 11 de outubro de 1995 e a incorporação deu-se em 30 de setembro de 1998.
De 2007 a 2008, o navio passou por uma reforma feita pela Babcock Marine, no estaleiro Devonport, para melhorias em diversos sistemas e nas acomodações dos tripulantes e dos Royal Marines.
A reforma custou £30 milhões. Entre 2012 a 2014, o navio foi submetido a outra reforma, essa mais extensa e onerosa, orçada em torno de £65 milhões, que renovou todo o cabeamento e tubulações do navio, ampliou a rede de fibra óptica, atualizou sensores e permitiu a instalação do avançado radar 3D Artisan.
Internamente, e construtivamente falando, o PHM Atlântico é muito semelhante a um navio mercante, pois seu projeto seguiu padrões mercantes para baratear os custos.
Os corredores são largos e compridos (com pouca compartimentação) para facilitar a construção e o trânsito da tripulação a bordo.
Para diminuir o risco de incêndios, existe uma preocupação muito grande com o controle de avarias a bordo.
Equipamentos de combate a incêndio, máscaras de oxigênio e mangueiras estão presentes em quase todo o navio.