A Olimpíada do Rio de Janeiro deu um novo fôlego à indústria de defesa nacional. Muito além do batalhão previsto de 85 mil homens, entre soldados e policiais, a aposta para o esquema de segurança dos jogos está na tecnologia: de bloqueadores de drones a sistemas de gestão e de tráfego aéreo.
Em meio à crise fiscal do governo, que levou a sucessivos cortes de investimentos em defesa, o evento se transforma numa vitrine para as empresas brasileiras do ramo, que veem uma oportunidade de ampliar os mercados de exportação dessas tecnologias.
Para a Associação Brasileira das Indústrias de Defesa e Segurança (ABIMDE), o Brasil ainda tem amplo potencial na área de segurança, tanto para atender às necessidades do mercado interno como para exportar essas tecnologias.
“O mercado de segurança e defesa no mundo é de US$ 1,5 trilhão, e o Brasil responde por apenas 2%. Há muito para crescer”, disse Frederico Aguiar, presidente da ABIMDE. Ele, no entanto, se mostra otimista com a visibilidade dos Jogos Olímpicos. “Todo evento desse porte traz não só o efeito direto da aquisição de equipamentos, mas é também uma vitrine, pois vai mostrar para o mundo que o Brasil não só está preparado com treinamento, mas com equipamento e serviços adequados.”
O monitoramento começa pelos céus. Um aparelho adquirido pelo Exército Brasileiro irá bloquear drones não autorizados próximos às instalações dos jogos. O sistema, chamado de jammer (interferidor), pode bloquear o sinal dos VANTs (Veículos Aéreos Não Tripulados) para além de um quilômetro de onde for instalado. O objetivo é desativar aparelhos suspeitos, uma vez que, conforme apurado pelo jornal O Estado de São Paulo, a utilização de drones com pequenos explosivos foi um dos métodos sugeridos pelo Estado Islâmico para a realização de ataques terroristas durante os jogos.
“É uma tecnologia inédita em eventos desse porte e 100% nacional”, afirmou Luiz Teixeira, presidente da Iacit, empresa localizada no interior de São Paulo que desenvolveu o equipamento. “O operador, quando detecta ameaça em algum drone, aciona o sistema de forma a bloquear a comunicação entre o controlador e o veículo. Ele toma o controle do VANT, que pode pousar ou retornar ao local de origem”, explicou.
O investimento necessário foi de R$ 1,5 milhão e envolveu dez engenheiros. “A Olimpíada ampliou a capacidade de projeção da empresa, que já está há 30 anos no mercado”, disse Teixeira. A ideia é expandir o uso do aparelho para outras áreas, como os presídios, onde há entregas ilegais via drones, bem como exportá-la. “Já fizemos demonstrações em vários países, como Espanha e Chile”, conclui.
Além de bloquear drones não autorizados, as Forças Armadas terão seus próprios VANTs para reforçar o sistema de segurança da Olimpíada. Criado pela FT Sistemas, o VANT FT-100 Horus será utilizado em missões de vigilância, monitoramento, detecção de alvos e levantamento de informações.
“Ele é um sistema militar, com uma tecnologia de ponta específica para uso em segurança e defesa dentro de ambientes hostis”, afirmou Nei Brasil, diretor-presidente da FT Sistemas. “A parceria com as Forças Armadas demonstra que o investimento em inovação é uma alternativa viável para o Brasil.” Ele afirma que os drones já são exportados para países africanos desde o ano passado, e a Olimpíada pode ajudar a abocanhar novos mercados.
O monitoramento dos céus abrange também os aviões. Serão utilizados nos aeroportos dois sistemas desenvolvidos pela Atech, empresa do Grupo Embraer, a fim de não só garantir a segurança, mas melhorar o fluxo para evitar atrasos. As tecnologias do Sagitário e do Sigma já eram utilizadas, mas foram adaptadas e atualizadas para os jogos.
“O foco do Sagitário é a segurança operacional, pois monitora os voos em tempo real”, explica Edson Mallaco, presidente da Atech. “Já o Sigma faz uma otimização do fluxo de aeronaves. O sistema recebe todos os planos de voo, os analisa e otimiza para evitar engarrafamentos no aeroporto em determinado momento. Pode antever o tráfego aéreo com até uma semana de antecedência”, explicou.
Ele afirma que a parceria com a Força Aérea permitiu que a empresa pudesse desenvolver não só com foco em defesa, mas também para o mercado corporativo. “Isso nos permite a comercialização desse sistema para outros mercados. Ele já está sendo implementado na Índia, por exemplo, e deve entrar em operação até o final deste ano.”
Além da gestão de veículos aéreos, a preparação para os jogos demanda um amplo monitoramento de dados. Essa gestão foi feita pela Fundação Ezute, empresa de direito privado sem fins lucrativos, que vem atuando em parceria com o Ministério do Esporte desde 2012.
A fundação, que esteve à frente de projetos como o Sistema de Vigilância da Amazônia e o Bilhete Único, desenvolveu um sistema que monitora processos em 35 instalações e faz a gestão de orçamentos, prazos, requisitos olímpicos e parâmetros legais. “A plataforma tem como foco cada instalação olímpica e todo o seu ciclo de desenvolvimento”, revelou Flavio Firmino, diretor de projetos especiais da Fundação Ezute. “Ela possui mecanismos para gestão de pontos críticos, cronogramas requisitos e também painéis estratégicos.”
Ele explica que o projeto nasceu mediante o diagnóstico de que o governo federal havia enfrentado dificuldades para gerir os recursos da Copa do Mundo. “Constava que o monitoramento da transferência de recursos para a Olimpíada seria conduzido pelo Ministério do Esporte, num modelo apoiado na contratação de consultorias. Apresentamos nossa experiência na área de gestão de projetos complexos e fomos contratados no final de 2012.”
A parceria com o Ministério do Esporte se encerra em abril do ano que vem.
Ivan Plavetz
Fonte: O Estado de São Paulo