Suécia e Finlândia: Uma forma diferente de pensar defesa

A Finlândia é hoje um dos vários países no mundo que possui um programa em andamento para substituir a sua frota de aeronaves de caça. Desde 1995, essa missão é cumprida por mais de 50 Boeing F/A-18 Hornet C/D Hornet, que substituíram no final daquela década tipos obsoletos para a época como o MiG-21 e o Saab Draken.

A necessidade de adquirir um vetor novo e moderno está na localização estratégica do território finlandês, numa região que acompanha a uma crescente escalada de tensão geopolítica. Além disso, em mais de 25 anos de operação, os F/A-18 passaram por dois importantes processos de modernização, sendo inviável realizar outro programa dessa natureza pelas limitações que o próprio projeto oferece.

O primeiro, chamado de Mid-Life Upgrade 1, foi conduzido de 2006 a 2010, compatibilizando o uso de capacete com mira acoplada (Helmet-Mounted Display), de mísseis de curto alcance guiados por infravermelho AIM-9X Sidewinder e outros sistemas que ampliaram a consciência situacional do piloto e as capacidades de operação integrada com outros países.

Já o MLU 2, realizado de 2012 a 2016, contemplou o uso de armamentos ar-solo guiados, com capacidade de lançamento stand-off, ou seja, fora do alcance das defesas inimigas. Além disso, reforçou os sistemas de contramedidas eletrônicas, autoproteção e de comunicação.

Mas apesar dos dois processos de atualização, os F/A-18 se apresentam defasados para continuar com a missão de defesa aérea, sendo que a sua desativação deve começar em 2025 e ser concluída em 2030.

Por meio do programa HX, cujo vencedor deve ser anunciado até o final de 2021, o país está avaliando os caças Saab Gripen E/F, Lockheed Martin F-35A, Boeing F/A-18 E/F Super Hornet, Dassault Rafale e Eurofighter Typhoon Tranche 3.

O contrato pode chegar até 10 bilhões de euros e envolver uma frota de 55 novos caças. Até o dia 30 de abril, as empresas devem enviar a sua melhor oferta, que inclui, além dos caças, contrapartidas com o envolvimento da indústria e da rede de pesquisa e desenvolvimento nacional.

Cada um dos concorrentes oferece algum tipo de diferencial. Por exemplo, o F-35A é o único da categoria de 5ª geração, com capacidade de invisibilidade aos radares, enquanto com o Super Hornet é uma evolução do modelo hoje operado pela Finlândia.

No caso do Gripen, existem outras vantagens que vão além das já conhecidas capacidades operacionais em si.

 

Cenário geopolítico

Até o ano de 2025, o orçamento de defesa da Suécia será reforçado em 40%. A razão para esses investimentos vem da deterioração da segurança e da escalada de tensão vivida na região do Mar Báltico, especialmente por conta do aumento da atividade militar da Rússia naquela região.

“O comportamento agressivo da Rússia na Crimeia, na Ucrânia, na Síria e no Mar Báltico, nos últimos anos, é uma realidade que enfrentamos. Constitui uma ameaça ao direito escolhas de políticas nacionais em todos os países vizinhos da Rússia” disse Peter Hultqvist, Ministro da Defesa da Suécia.

“A Suécia não é membro de nenhuma aliança militar, mas coopera extensivamente com outros Estados e organizações no campo da defesa. Esse engajamento cooperativo é parte integral da nossa política de segurança e defesa e nós desenvolvemos um planejamento operacional conjunto com a Finlândia, podendo ser estendido para a Dinamarca, Noruega, Reino Unido, Estados Unidos e a OTAN.

Um Gripen C lidera uma formação composta por um F-16 da Dinamarca e um F/A-18 Hornet durante exercícios combinados.

A Finlândia e a Suécia possuem um longo histórico de cooperação na área de defesa e segurança, incluindo um diálogo estreito em interesses e desafios comuns, o fortalecimento das capacidades militares dos países e a criação de pré-requisitos para ações operações militares conjuntas em qualquer situação”, conclui o ministro.

Além da geografia e do clima, os países têm outras características em comum. Possuem conscritos nas forças armadas, operam com as suas aeronaves a partir de bases aéreas principais e dispersadas e têm a força aérea como principal elemento dissuasório para evitar um conflito ou, como primeira respondedora, fazer com que este tenha curta duração poupando a economia do país, os recursos materiais e, principalmente, humanos.

 

1+1=4

Aproveitando as décadas de relacionamento e as inúmeras cooperações já realizadas, em 2015 os países estabeleceram o Ato de Defesa estreitando ainda mais essa parceria. A partir de então, os exercícios e operações conjuntas evoluíram em quantidade e complexidade, chegando ao ponto de militares suecos integrarem, nessas ocasiões, a equipe de Estado-Maior da Finlândia, e vice-versa.

Além da qualidade técnica, havia a necessidade de incrementar a doutrina e as táticas de operação. Assim, os exercícios Aurora, Northern Wind, Ruska e Artic Challenges Exercises são alguns dos vários exemplos que ampliaram a interoperabilidade em termos de comunicação, planejamento e atuação em campo em todas as situações, desde ameaças, crises ou guerras.

A combinação de recursos humanos e de equipamentos militares, dos níveis táticos e operacionais até os políticos e estratégicos, resulta num efeito multiplicador de força, onde um mais um resulta em três. Mas, dependendo de outros fatores, esse resultado pode ser quatro.

Se hoje, operando com modelos de caças diferentes, os resultados dessa interação já são impressionantes, no caso da Finlândia optar pelo Gripen o efeito multiplicador seria ainda maior.

Basta dizer que os países podem compartilhar a mesma doutrina, utilizar os mesmos recursos humanos para a manutenção e suporte dos caças e dividir o mesmo estoque de peças se necessário.

Compatível com ambientes de operação extremos, do calor e humidade tropical ao frio seco e com neve, outro ponto a favor do Gripen está no seu desenvolvimento voltado para contrapor, principalmente, sistemas de armas de origem russa, uma ameaça que tinha se afastado com o colapso da antiga União Soviética, mas que, hoje, volta a ser cada vez mais presente na geopolítica dos países nórdicos.

A facilidade na atualização do Gripen, feita a cada três ou quatro anos, diferente MLU tradicional, que é mais oneroso e demorado, vai ao encontro da filosofia finlandesa de manter a sua frota de caças sempre atualizadas ao longo das décadas.

“Mesmo que nós fossemos membros da ONU e da União Europeia, nós não poderíamos contar com um apoio e ajuda no primeiro dia de uma situação de hostilidade. Os países nórdicos, especialmente a Finlândia e a Suécia, que não fazem parte de alianças militares, temos que ter a capacidade de nos cuidar, sozinhos, por um dia, por semanas ou até mesmo por meses.

Do ponto de vista de uma força aérea, os nossos países, incluindo a Noruega, possuem o seu território na direção sul-norte, mas o nosso vizinho (Rússia) é para o Leste. Então, se nós pudéssemos mudar as nossas fronteiras seria melhor, para a direção leste-oeste. Trabalhando juntos, podemos mudar essa situação. A Suécia, nesse caso, seria a parte de trás para a Finlândia, que poderia se deslocar para a Suécia e utilizar nossas bases principais e as dispersadas, se assim necessário. A nossa Força Aérea, por outro lado, pode voar para a Finlândia e operar da mesma forma apoiando o país na defesa do seu território”, disse o General Brigadeiro Anders Persson, vice-chefe da Força Aérea Sueca.

Fica claro que a Finlândia e a Suécia, além de características, organização, estruturas militares, clima e geografia em comum, enfrentam hoje uma ameaça semelhante. A melhor maneira para manter o poder dissuasório ou superar essa ameaças numa situação de conflito é manter a interoperabilidade das suas forças em dia. Com um caça comum no inventário dos dois países, essa situação ganharia um efeito ainda maior.

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Uma resposta

  1. Boa noite a todos!
    Estou na torcida para que o SAAB Gripen E/F se consagre vitorioso nessa licitação.
    Ganha Finlândia, ganha Suécia, e por tabela, ganha o Brasil!
    Att.

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