Classe Tamandaré – uma análise completa

Artigo publicado originalmente edição nº 151 da revista Tecnologia & Defesa

Por Paulo Maia

No dia seis de novembro de 2017 o monitor fluvial Parnaíba completou 80 anos de seu batismo e lançamento ao mar, evento notável que ocorreu no Arsenal de Marinha da Ilha das Cobras, hoje Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ).

O navio, que teve a quilha batida pelo então presidente da República Getúlio Dornelles Vargas, teve como madrinha a primeira dama, a senhora Darcy Sarmanho Vargas, e representou um marco da retomada da construção naval militar brasileira no século 20.

O Parnaíba, ao longo dessas oito décadas, tem sido o símbolo vivo do maior desafio que a Marinha do Brasil (MB) vem enfrentado ao longo dos anos, que é a construção de seus meios em ritmo constante e evolutivo.

Apesar da ocorrência em vários períodos de intensa atividade industrial quanto a navios mercantes de diversas Classes, bem como a existência expressiva de estaleiros privados, não foi possível o estabelecimento de recursos satisfatórios, tecnológicos e materiais, para desenvolver e manter a moderna construção de navios de guerra, a exemplo das nações mais desenvolvidas.

A falta de uma consistente vocação marítima e a baixa prioridade que sucessivos governos têm destinado à modernização do Poder Naval brasileiro tem forçado ao cancelamento ou redução de programas de renovação e ampliação de meios flutuantes e, consequentemente, na existência de ciclos espasmódicos de construção de navios militares, em especial os destinados ao aparelhamento da Esquadra.

Na década de 1930 foi registrado mais um desses ciclos.

A construção de navios para Marinha estava estagnada desde o final do século 19. A chamada Esquadra de 1910 era constituída de meios encomendados na Inglaterra e os planos posteriores foram baseados em obtenções no exterior.

O ministro da Marinha daquele período, o almirante Henrique Aristides Guilhem, e outros importantes chefes navais estavam convencidos de que a solução do problema deveria ser doméstica, embora avaliassem que o empreendimento demandaria grande esforço devido à radical transformação nos métodos de trabalho, além da evolução vertiginosa das indústrias, em especial as de aço e máquinas, as quais o Brasil não havia acompanhado.

Para que o desequilíbrio fosse superado a Administração Naval planejou a preparação de seus arsenais e estaleiros para a produção de navios com material importado formando, assim, engenheiros, técnicos e operários para, no futuro, quando as indústrias brasileiras avançassem tecnologicamente e produzissem os materiais necessários, os mesmos seriam empregados em obras exclusivamente realizadas com insumos nacionais.

Tomada esta decisão e já estando pronto o Arsenal da Ilha das Cobras foi planejada a renovação da Esquadra.

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O programa abrangia a obtenção de três contratorpedeiros da Classe Marcilio Dias, seis contratorpedeiros da Classe Amazonas, seis corvetas da Classe Carioca e dois monitores fluviais, acrescidos na década de 1940 de seis corvetas da Classe Barreto de Menezes, construídas no estaleiro da Organização Henrique Lage, em Niterói (RJ).

Os primeiros contratorpedeiros ficaram prontos em 1943, enquanto que os Amazonas somente no início dos anos de 1950. Com o fim da Segunda Guerra Mundial a construção de navios perdeu toda sua intensidade e apenas seis pequenos caça-submarinos de casco de madeira da Classe Piraju foram encomendados.

O Programa Naval de 1935 teve o mérito de aproveitar o pequeno parque industrial existente, utilizando as próprias instalações da Marinha e estaleiro privado.

Entretanto, essa base para uma indústria naval sólida viu desparecer inexplicavelmente o apoio governamental, sendo abandonada por completo. A falta de continuidade da construção de navios militares no País impediu que fosse consolidada as técnicas de construção, aproveitando-se de novos projetos ou aperfeiçoando os anteriores.

Tal retração, alheia à vontade da MB, estagnou o progresso do setor, impossibilitando os técnicos de acompanhar o desenvolvimento tecnológico e a possibilidade de que houvesse a pesquisa e elaboração de projetos. Com aquela realidade a política de renovação de meios navais voltou a ser de compras no exterior e no recebimento de excedentes da Marinha dos Estados Unidos. Um novo alento surgiria em 1967 com um novo Programa Naval que contemplou a obtenção de navios para a modernização da Esquadra, que possibilitaram um salto tecnológico de 30 anos em relação aos meios em operação naquele momento.

Imagem DPHDM – Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha.

O Programa de 1967 constituído, entre outros meios, por submarinos, fragatas da Classe Niterói, navios-patrulha costeiros e fluviais, navios varredores e navio-tanque, previu construções no exterior e no Brasil, no AMRJ e em estaleiros privados, significando mais uma tentativa de implantação de forma perene a construção de um Poder Naval compatível com a dependência do Brasil do mar.

No AMRJ foram produzidas as fragatas Independência e União e navios-patrulha fluviais e costeiros, enquanto a iniciativa privada ficou com lanchas hidrográficas, patrulheiros fluviais e o navio tanque Marajó.

O Programa de 1967, fruto de um estudo realizado pelo Estado-Maior da Armada, ao ser aprovado pelo presidente da República sofreu várias modificações que diminuíram a quantidade de meios planejados. Apesar da significativa redução dos navios a serem obtidos, decisões da área econômica do governo bloquearam a sua plena execução não sendo possível, por exemplo, fragatas, submarinos e navios-patrulha adicionais conforme estava previsto na autorização presidencial.

Mais uma vez a possibilidade de se criar um ciclo permanente de obtenção de navios nacionais que atendessem as constantes demandas de modernização e renovação do inventário da Armada brasileira ficou comprometida. Em 1981 o AMRJ deu a largada para outro ciclo modesto de obras com o batimento da quilha do navio-escola Brasil e, nos anos seguintes, a construção das corvetas da Classe Inhaúma.

Esse impulso neste importante complexo continuou na década de 1990, de forma comedida, quase cessando, em função dos óbices causados pelas restrições orçamentárias, quando foram construídos exemplares dos navios patrulha da Classe Grajaú e os submarinos da Classe Tupi, resultado de um bem sucedido programa de cooperação com a Alemanha e apoiado em financiamento de bancos alemães o que, seguido de outro, fez que fosse completamente realizado.

A fragata F-46 Greenhalg navega em formação com o submarino S-30 Tupi.

A capacitação para construir submarinos também viria a enfrentar dificuldades diante do êxodo de profissionais altamente qualificados que não encontraram reconhecimento de suas habilidades e conhecimentos, com a redução real de seus salários junto à escassez de aportes financeiros nacionais.

Lançados os navios ao mar e incorporados ao serviço ativo, outro longo período de estagnação e atraso se registrou, com a conclusão, já no século 21, no AMRJ do submarino Tikuna e da corveta Barroso, navio que simboliza um capítulo final de um esforço vital que não foi prosseguido, como uma longa novela que durou 14 anos, chegando ao término graças à tenacidade da Marinha em seu objetivo permanente de buscar a grandeza que é inerente aos grandes estados marítimos do planeta.

Os anos da década de 1990 encerram uma fase de ascensão tecnológica iniciada nos empolgantes anos de 1970 e acelerada nos anos de 1980, a qual, certamente, em um país voltado para o mar seria permanente.

As primeiras Corvetas brasileiras

As corvetas da Classe Inhaúma (Inhaúma, Jaceguai, Júlio de Noronha e Frontin) comissionadas na Esquadra entre os anos de 1989 e 1994 foram o resultado de estudos do final da década de 1970 que, inicialmente, objetivavam a retirada dos navios de patrulha oceânicados rebocadores de alto mar (reclassificados no Brasil como corvetas), de origem holandesa, da Classe Imperial Marinheiro.

Mas, nesse mesmo período, começou a ser avaliada a necessidade de substituição dos valentes contratorpedeiros de origem norte-americana que chegavam ao final de suas vidas uteis.

O projeto então evoluiu em função de novas especificações para o de uma corveta com quase 2.000 toneladas de deslocamento em sua versão final. A Marinha desejava 16 exemplares, que seriam produzidos no AMRJ e em estaleiros privados. Novamente, a crônica falta de recursos que sempre obliterou os programas navais brasileiros reduziu para apenas quatro navios.

As Classe Inhaúma foram projetadas para a proteção das Linhas de Comunicação Marítimas, com capacidade para a guerra de superfície e antissubmarino, além de poderem prover proteção antiaérea de ponto e apoio de fogo naval em operações de caráter anfíbio.

O chamado Projeto Corveta ainda tinha como objetivo impedir que fosse estabelecido mais um período de estagnação e que houvesse a perda gradual da capacidade que tinha sido adquirida. No caso específico das Inhaúma houve um grande financiamento externo para o sistema de armas, a parte mais complexa, de maior custo e de mais rápida evolução em um moderno navio de guerra.

Contudo, quanto à propulsão foi recusada tal solução pois resultaria na renúncia à nacionalização de subsistemas e equipamentos e na maior dependência logística, somando-se a isso a exclusão da engenharia de projeto brasileira na concepção deste importante sistema.

A opção adotada foi projetar e nacionalizar parcialmente a propulsão dos navios. Isso trouxe um bem razoável índice de nacionalização. Destaque-se que somente 7,5 % do total de engenheiros envolvidos nas fases de concepção e preliminar da engenharia de projetos das corvetas eram estrangeiros.

E vale a pena registrar que foram especificados e fabricados sistemas e equipamentos dos navios no Brasil, através de consórcios ou não de empresas nacionais e estrangerias, selecionadas cuidadosamente quanto às suas competências técnicas referentes à suas capacidades em atender rígidas cláusulas e especificações contratuais de nacionalização e garantia de qualidade.

Mesmo com os resultados altamente positivos alcançados no desenvolvimento e construção das primeiras corvetas, a falta de um projeto permanente de um complexo industrial militar brasileiro impediu, mais uma vez, que a engenharia nacional desse segmento progredisse, algo que somente ocorre com sucessões ininterruptas de projetos, construções, avaliações técnicas e reprojetos.

Atualmente, somente as Jaceguai e Júlio de Noronha, em diferentes etapas de modernização, encontram-se em operação. A Frontin e a Inhaúma foram retiradas de serviço respectivamente em setembro de 2015 e novembro de 2016.

A quantidade inexpressiva construída não permitiu que a aposentadoria dos antigos contratorpedeiros fosse viabilizada, e foi preciso a compra por oportunidade, para preenchimento da lacuna quantitativa e qualitativa que se formava na Esquadra, de fragatas de escolta da Classe Garcia, nos Estados Unidos, e Type 22, na Inglaterra.

As duas Type 22 que restaram na Marinha do Brasil navegam lado a lado.

Também foi levada a cabo uma modernização primorosa das fragatas da Classe Niterói com uma significativa atualização dos sistemas de armas e sensores, o que levou, ainda hoje, com algumas restrições pela idade, a que esses navios se mantenham como a espinha dorsal da Esquadra.

Com o abandono definitivo da meta de construir mais doze irmãs da Inhaúma, nos primeiros anos da década de 1990 a MB manteve seu propósito maior e anunciou a possibilidade da construção de uma derivação do projeto da Classe que compreenderia naquele momento dois navios.

Disso surgiu a corveta Barroso que, por ser um aperfeiçoamento, tornou-se o primeiro navio de guerra projetado e construído no País durante a República, e que não pode ser considerado um protótipo.

Único de sua Classe, já que não houve recursos para uma segunda unidade, teve um longo período de obras; a quilha foi batida no dia 31 de dezembro de 1994; o lançamento ao mar, previsto para junho de 1999, só aconteceu em 20 de dezembro de 2002; e a incorporação do navio ao serviço ativo, planejada para junho de 2006, deu-se em 19 de agosto de 2008.

A Barroso, com suas modestas 2.350 toneladas, tem se mostrado um grande navio, fruto da capacidade da engenharia naval brasileira de superar o descaso da agenda nacional com a defesa e de projetar e construir um moderno navio de guerra.

Vem representando a vocação oceânica da Marinha do Brasil operando com eficiência nos oceanos (Atlântico, Pacifico e Índico) e no Mar Mediterrâneo onde por duas vezes assumiu o posto de nau-capitânia da Força-Tarefa Marítima da Força Interina das Nações Unidas do Líbano (FTM-UNIFIL).

Classe Tamandaré

Com a elaboração da Estratégia Nacional de Defesa (END), a Marinha foi orientada a apresentar ao Ministério da Defesa as suas necessidades em curto, médio e longo prazos, para cumprir de maneira satisfatória suas atribuições constitucionais e o previsto na END.

A Força também deveria detalhar como pretendia obter tais meios e de que forma seria sua articulação com a indústria nacional para viabilização parcial ou total do que pretendia até por volta do ano de 2031. Surgiu desta forma o Plano de Articulação e Equipamento da Marinha do Brasil (PEAMB).

A MB, na época, definiu várias prioridades, entre essas o ProSub, em andamento; o Programa de Obtenção de Navios Anfíbios e o Programa de Obtenção de Meios de Superfície (ProSuper).

Este programa prevê (ou previa) cinco navios escolta de pelo menos 6.000 toneladas, adequados a operações prolongadas e em cenários de guerra naval de altíssima intensidade; cinco navios-patrulha de 1.800 toneladas, capazes de longa permanência nas águas jurisdicionais brasileiras (AJB) com ênfase na patrulha das áreas de produção de petróleo; e um navio de apoio logístico de 24.000 toneladas, capaz de multiplicar a capacidade de um Grupo Tarefa em permanecer em operações nas AJB ou em uma área de crise ou de conflito em atendimento a interesses nacionais ou sob mandato internacional, a exemplo das Marinhas mais desenvolvidas com Produto Interno Bruto equivalente ou até menor que o brasileiro.

Para a implementação do ProSuper informações preliminares indicavam um investimento de cerca de USD 5,7 bilhões e que os navios poderiam ser prontificados em aproximadamente 12 anos, com a geração em torno de 13.000 empregos diretos e indiretos no Brasil.

Uma segunda etapa teria o mesmo potencial econômico e permitiria a implantação de uma indústria naval militar tecnologicamente desenvolvida. Quando do lançamento do ProSuper, acreditando em sua viabilidade, estaleiros de sete países apresentaram-se como parceiros no empreendimento, pois os contratos seriam assinados com um estaleiro detentor do projeto dos navios e suportados por acordos entre governos.

Esse modelo estratégico previa que todos os navios seriam construídos em estaleiros brasileiros, junto de transferência de tecnologia, compensações industriais, atendimento de requisitos de nacionalização e de apoio logístico. O ProSuper, junto ao ProSub, traria ao Brasil uma capacidade industrial e tecnológica na área naval compatível com a dos países mais desenvolvidos do mundo, além de amplos benefícios em diversos segmentos da economia como, por exemplo, navipeças, siderurgia, eletrônica, cabos elétricos, motores, tintas e máquinas.

Maquete da Corveta Classe Tamandaré exposta no estande da Emgepron, LAAD 2017.

Contudo, mesmo com todos esses fatores e a necessidade premente de se iniciar o processo de substituição das fragatas das Classes Niterói e Greenhalgh, em abril de 2015 foi anunciado que o ProSuper seria momentaneamente paralisado com a histórica justificativa de sempre: é imperioso atender ao programa de ajustes orçamentários do governo.

Diante disso, e com a expectativa de um quadro de restrição orçamentária  na área de Defesa prejudicando a reposição imediata dos navios em operação que estão chegando ao seu limite no horizonte que se aproxima, situação agravada pela baixa de vários outros de seus navios sem que houvesse a mínima reposição, foi decidido pela MB um estudo de viabilidade para a construção das corvetas da Classe Tamandaré, que se constitui em um programa modesto mas de grande importância para a recuperação e ampliação das capacidades dos estaleiros nacionais, duramente adquiridas com a construção das Classes de corvetas anteriores.

Esses futuros navios, que serão batizados com os nomes de Tamandaré, Jerônimo de Albuquerque, Cunha Moreira e Mariz e Barros, concorrerão para a renovação e o aparelhamento da Força Naval e para o incremento do potencial intelectual, tecnológico e científico da Base Industrial de Defesa (BID).

Vista lateral do Projeto: limpeza de linhas e furtividade.

Quando em operação deverão patrulhar as AJB, com ênfase na proteção e fiscalização das atividades econômicas, principalmente a pesqueira e a petrolífera; na atuação em áreas afastadas, compondo Grupos Tarefas; ou como unidades de busca e ataque a submarinos e na proteção de unidades integrantes do corpo principal das Forças Navais, proporcionando sua autodefesa.

Os primeiros passos do atual programa (CCT) aconteceram em janeiro de 2013 quando a Diretoria Geral de Material da Marinha (DGMM) encaminhou ao Centro de Projetos de Navios (CPN) os Requisitos de Alto Nível de Sistemas (RANS) da designada, então, corveta 03 (CV-03). Na ocasião foi determinado que fosse realizada a elaboração de Estudos de Exeqüibilidade (EE) de uma corveta que seria apenas uma atualização tecnológica da Barroso, para que as obras da primeira unidade começassem até o final de 2014.

Durante a realização dos EE foi constatado que diversos equipamentos adotados na Barroso estão logisticamente obsoletos e que seria preciso conceber um novo navio que começou a se diferenciar especialmente em relação aos sistemas de propulsão, armas e tripulação.

O desenvolvimento de sistemas novos e o atendimento dos prazos estipulados e de qualificação do corpo técnico do CPN conduziu a um processo licitatório para a escolha de uma empresa já com experiência em projeto semelhante e que garantisse o fornecimento dessa expertise e a troca aberta de conhecimentos entre as duas equipes.

A Vard Niterói, vencedora da licitação, recebeu o Projeto de Concepção realizado pelo CPN entre agosto de 2013 e março de 2014, para conduzir o desenvolvimento das fases Preliminar e de Contrato.

A mais nova versão do SICONTA, um desenvolvimento nacional, deverá ser instalada nas Corvetas Classe Tamandaré.

A Vard Niterói, entre outras disposições contratuais, se responsabilizaria pela certificação dos documentos produzidos, por uma Sociedade Classificadora reconhecida internacionalmente e com regras definidas para navios militares.

Em atendimento a este requisito fundamental foi apresentada e aceita pelo CPN a sociedade italiana para classificação de navios militares RINA (Registro Italiano Navale), respaldada em sua norma de projetos Rinamil/2011 (Regolamento per La Classificazione di Navi Militare) que, ao lado dos requisitos estabelecidos nos RANS e outras normas técnicas reconhecidas pelo CPN, passaram a ser a base de todas as fases do projeto das CV 03.

A partir deste momento ficou comprovado que projetar um navio com base na corveta Barroso não era exequível. Os critérios mais rigorosos da norma italiana, quando comparados aos aplicados à construção da Barroso, exigiu que a atualização do Projeto de Concepção deveria atender obrigatoriamente as seguintes condições:

  1. Atender ao critério da norma Rinamil/2011 referente à segurança da tripulação e compartimentação do navio, alterando assim o arranjo geral e o plano de capacidades desenvolvidos originariamente pelo CPN;
  2. Atender aos critérios da norma Rinamil/2011 referentes à estabilidade intacta ou em condição de avaria, implicando assim em controle de pesos e centros com margens de projeto muito mais rigorosas do que o estabelecido pelo CPN;
  3. Atender o estabelecido pela Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios – MarPol, com a eliminação do sistema de tanques compensados de combustível (mistura de combustível e água) que são utilizados pela Barroso em beneficio da garantia de sua estabilidade; e
  4. Obrigatoriedade de atendimento aos demais requisitos, com ênfase especial ao desempenho hidrodinâmico do navio.

As adequações do projeto por força de atendimento da norma mencionada levaram a adoção de tanques de lastro com água limpa em substituição de tanques compensados e alterações no formato do casco para melhor atender a critérios de estabilidade, sem que houvesse prejuízo aos requisitos de velocidade.

As revisões, adequações e alterações sucessivas do projeto formaram um conjunto de características próprias que o tornaram único fazendo com que fosse então denominado como CCT. Em dezembro de 2015, o Projeto Preliminar classificado pela RINA do futuro navio escolta da Esquadra brasileira, foi entregue pela Vard Niterói.

T&D Nº 151: O momento da virada para a Marinha do Brasil com a Corveta Classe Tamandaré. (Arte: Gino Marcomini).

Em relação à Barroso as CCT apresentam diferenças e ganhos significativos, entre eles podem ser destacados os seguintes:

  • Mudança significativa da geometria da superestrutura e do mastro visando a redução de RCS (Radar Cross Section) ;
  • Aumento do pontal ao longo da proa com a inclusão de um convés através do prolongamento do convés 01 com a manutenção da borda livre no bico da proa. Esta modificação permitiu maior disponibilidade de espaços.
  • Eliminação do tosamento (curvatura longitudinal do convés de um navio) e do abaulamento da proa o que permitira uma melhor performance das fainas no convés 01, além da eliminação da descontinuidade estrutural na transição do tosamento com o convés supra mencionado.
  • Prolongamento do convés de vôo.
  • Aumento geral da boca do navio na linha d’água.
  • Otimização das formas do casco nas proa e popa, melhorando o desempenho hidrodinâmico ( fato comprovado em tanques de testes ).
  • Inclusão de lanchas militares ETRH (Embarcações Rápidas de Casco Rígido).
  • Eliminação de tanque de combustível compensado, atendendo as normas MARPOL e classificadora RINA.
  • Inclusão de tanques de lastro permitindo um melhor controle de estabilidade, incluindo banda e trim (inclinaçãolongitudinalde um navio para uma das suas extremidades, proa ou popa).
  • Inclusão de dois lançadores VLS para MAS na proa.
  • Propulsão CODAD (Combined Diesel and Diesel – Combinada Diesel com Diesel), com duas linhas de eixo, dois hélices de passo controlável e quatro motores de combustão principal – MCP diesel.
  • Aumento da capacidade de aguada.
  • Subdivisão do casco em anteparas estanques transversais, garantindo uma melhor flutuabilidade e sobrevivência em caso de danos em combate.
  • Adoção de arranjo geral verticalizado, sem circulação horizontal entre compartimentos estanques.
  • Adoção de corredor central espaçoso, no convés principal, facilitando o escape e circulação em caso de avarias graves no navio.
  • Modificação no arranjo geral com melhorias na circulação eficiente de pessoal, conforto e segurança. Incluído camarote para duas oficiais femininas.
  • Adoção de perfis leves do tipo bulbo e do aço naval AH 36. Este aço proporciona uma estrutura com maior resistência e menor peso.
  • Adoção de paiol de munição central protegido e de paióis de pronto uso próximo dos sistemas de armas.

O primeiro passo para procurar tornar o programa das CCT uma realidade  foi dado no dia 10 de abril de 2017, quando a Diretoria de Gestão de Programas da Marinha (DGePM) publicou no Diário Oficial da União um Chamamento Público convidando para participar do futuro processo licitatório empresas ou consórcios, nacionais ou estrangeiros, capacitados nos últimos dez anos em construção de navios militares de alta complexidade tecnológica, com deslocamento superior a 2.500 toneladas.

Em 10 de maio foi informado o encerramento da primeira etapa, para construção, de quatro navios com requisitos pautados no projeto básico de corvetas da Classe Tamandaré

As seguintes empresas/consórcios, por ordem alfabética, apresentaram documentações: BAE Systems Ltd; Chalkins Shipyards S/A; China Shipbuilding and Offshore Co Ltd; China Shipbuilding Trading CO Ltd; Damen Schelde Naval Shipbuilding B.V.; DCNS do Brasil Serviços Navais Ltda; Fincantieri S.p.A.; German Naval Yards Kiel GmbH; Goa Shipyard Ltd; Mazagon Dock Shipbuilders Ltd; Navantia S/A; Poly Technologies Inc; Posco Daewoo do Brasil; Rosoboronexport Joint Stock Company; SAAB AB; Singapore Technologies Marine Ltd; State Research and Design Shipbuilding Centre; Turkish Associated International Shipyards; Thyssenkrupp Marine Systems GmbH; Wuhu Shipyard CO Ltd; e Zentech do Brasil Serviços Técnicos Ltda. A sequência prevê a elaboração e divulgação da Solicitação de Proposta (Request for Proposal – RFP). No dia 19 de dezembro, na Escola de Guerra Naval foi realizado oficialmente o lançamento da segunda etapa do projeto das corvetas da Classe Tamandaré.

No passado recente, a impossibilidade de se construir as corvetas planejadas fruto das imposições orçamentárias, e a desativação de diversos contratorpedeiros obrigou a MB a incorporar navios de escolta de segunda mão que, ao preencherem uma lacuna na solução de um problema urgente, contribuíram para a estagnação do desenvolvimento da indústria naval militar do País.

Hoje, mais uma vez, a historia se repete com o envelhecimento em bloco dos navios de escolta que são o cerne da força de superfície da Esquadra e a falta gravíssima de navios em construção.

O projeto das corvetas Classe Tamandaré contribuirá para que se continue a trilhar o longo e complexo processo de nacionalização de meios e sistemas navais, permitindo assim que na próxima etapa evolutiva seja possível desenvolver navios de maior tonelagem e com maiores capacidades de combate, tão necessários a defesa dos interesses do Brasil no mar.

Uma observação

A construção naval (militar e civil) alavanca a economia trazendo ganhos tecnológicos e milhares de empregos, renda e impostos. As nações mais importantes do mundo tratam desse segmento como estrutura estratégica a ser preservada e incentivada. Nesse contexto as corvetas da Classe Tamandaré podem vir a ser um marco na história naval brasileira ao demonstrar a capacitação alcançada para conceber, executar e controlar todas as fases de obtenção de um moderno navio de guerra.

O caminho está pronto e agora é seguir adiante, sem lapsos e interrupções, evoluindo sempre. Entretanto, é preciso lembrar que para haver a tão almejada evolução é necessária vontade política e seriedade com as contas públicas. Como se sabe, os orçamentos da Defesa são sempre duramente atingidos por cortes e contingenciamentos. Parece haver uma falta de comprometimento com esse assunto tão sério, mesmo porque alguns segmentos com voz na área política gostariam de ver as Forças Armadas transformadas em simples Guarda Nacional e Costeira, o que poderia atender a determinados interesses estrangeiros que vêem no crescimento do Brasil um ameaça às suas influências e hegemonias.

Para que o Brasil e sua população avancem e ocupem um lugar de destaque no concerto das nações é imperativo que a crise ética e moral que se descortina de forma contundente, a cada dia, com a divulgação de escândalos criminosos de desvios de recursos públicos e de corrupção seja radicalmente extirpada do coração da nação que sangra indignado. E quando a sociedade em uníssono repudiar a tal politicagem e um governo constituído por pessoas de bem assumir o poder  consciente de suas obrigações e deveres com a pátria e seu povo, o País, além da estabilidade econômica e social terá Forças Armadas com meios operacionais e real capacidade dissuasória e a Marinha do Brasil será então para sempre uma Força Naval de águas azuis.

#MarinhaInforma
A Marinha do Brasil avançou no Projeto Corvetas Classe “Tamandaré”!
Mais uma etapa foi finalizada: a de Entrega das Propostas pelas empresas interessadas no nosso Projeto.
Empresas de Defesa entregaram ontem à Diretoria de Gestão de Programas Estratégicos da Marinha (DGePM) suas propostas comerciais e foram recebidas, após a análise documental, 09 delas. As propostas serão analisadas sob os pontos de vista técnico, jurídico, fiscal e orçamentário/financeiro.
As próximas etapas do processo:
Divulgação da “Short list” – 27/08/2018
Divulgação da Melhor Oferta – 29/10/2018
A lista completa das propostas aceitas e as referidas empresas e consórcios, você acessa aqui:
https://www.marinha.mil.br/notas-a-imprensa
É a Marinha do Brasil avançando na proteção de suas riquezas!

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