A discussão sobre a parceria comercial entre os fabricantes de aeronaves Boeing e Embraer* continua acontecendo em Brasília, mas com uma participação mais ativa do Governo Brasileiro e seu staff militar (*revelada ao final de 2017).
Segundo fontes próximas as negociações, o interesse da Boeing não se restringiria a Divisão de Aeronaves Comerciais / Executivas (responsável por mais de 60% do faturamento bruto da empresa), mas alcançaria também a Embraer Defesa & Segurança (EDS).
Na atualidade, a EDS oferece no mercado dois produtos de ponta, o líder no segmento de aeronaves de ataque leve/treinamento avançado turboélice, o A-29 Super Tucano, e o “game changer” no mercado de aeronaves de transporte militar, o jato cargueiro / reabastecedor KC390, em fase final de desenvolvimento/certificação.
O Governo Brasileiro, até esse ponto, não apresentava restrições a uma parceria entre as empresas para a promoção dessas aeronaves, mesmo por que, para citar o status quo do Programa Super Tucano, atualmente o avião é fabricado em Jacksonville (Flórida), em parceria com a empresa local Sierra Nevada.
Essa foi a maneira encontrada pela EDS para tornar seu produto (de excelência) competitivo aos olhos do mercado norte-americano (leia-se Buy Act).
A questão dos Programas Militares Brasileiros e a EDS
A EDS também é responsável por administrar um “guarda chuva” de empresas associadas que atuam em programas considerados estratégicos pelos militares das três forças.
No Exército, a EDS e suas afiliadas SAVIS, TERPRO e BRADAR tem papel decisivo na integração de sistemas de sistemas do SISFRON (vigilância de fronteiras).
Sabe-se que o Programa, tido como um dos indutores de transformação do Exército Brasileiro, está prestes a deslanchar a sua nova fase, denominada SISFRON 2, após a implementação do piloto cobrindo toda a fronteira Brasil x Bolívia, com o Comando e Controle localizado na cidade de Dourados (Mato Grosso do Sul).
O projeto-piloto do SISFRON, operado na 4ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, abrange 650 quilômetros de fronteiras monitoradas por radares fixos e móveis (fornecidos pela BRADAR), sensores óticos, óculos de visão noturna, câmeras de longo alcance, entre outros materiais empregados.
Essa primeira fase recebeu R$ 228 milhões em recursos orçamentários no ano de 2016, e outros R$ 470 milhões estavam previstos para 2017. Mais da metade desse valor acabou nos cortes efetuados pelo Governo Federal no orçamento do Ministério da Defesa.
O empreendimento, operacional em 650 km no momento, deverá tornar-se uma realidade em 17 mil quilômetros totais, algo como a terceira maior fronteira seca do mundo, com 10 países vizinhos, alguns deles reconhecidos pelas entidades internacionais de controle como nações produtoras e/ou fornecedoras de drogas.
Além desse tipo de crime, o Brasil também tem de lidar com o contrabando de armas, o tráfico de pessoas, o descaminho e evasão de riquezas minerais e biológicas, dentre outros ilícitos transnacionais.
Na Força Aérea Brasileira, a EDS é a main contractor do Programa Gripen E/F, o novo jato de combate multitarefa selecionado em 2013 e cujo contrato foi assinado com a SAAB em 2015.
Um complexo e avançado programa de transferência de tecnologia foi acordado entre Brasil e Suécia, e hoje, mais de uma centena de engenheiros brasileiros encontram-se trabalhando em instalações suecas recebendo treinamento e conhecimento sobre diversos aspectos do caça.
Os acordos industriais firmados para alavancar a produção do avião no Brasil envolvem parceiros domésticos como a Akaer (aero-estruturas), Inbrafiltro (componentes), AEL Sistemas (aviônica avançada e o crítico Link BR-2 de comunicações), para citar alguns exemplos entre as empresas estratégicas de defesa (EED) mais singulares.
A empresa Atech, integrante do Grupo Embraer especializada no desenvolvimento de soluções para missões críticas e tecnologias para apoio à tomada de decisão, tem como foco de atuação os mercados de Defesa e Segurança Pública, Tráfego Aéreo e mercado Corporativo.
Reconhecida como uma “System House” brasileira, teve destacado papel no programa de offset do Governo Brasileiro para o Programa P-3BR, aeronave de Patrulha Marítima da Força Aérea Brasileira.
O Programa P-3BR teve seu início em 2006 com a participação da Atech no desenvolvimento do Sistema Tático de Missão (TMS) embarcado nas aeronaves P-3AM ORION.
O sistema integra e gerencia radar, câmera infravermelha, sensores acústicos e magnéticos e o sistema de armas da aeronave tornando a missão de patrulha muito mais eficiente. A primeira aeronave da frota foi entregue em 2011.
Tendo atuado na modernização dos sistemas embarcados, na integração de novos sistemas à plataforma aérea e na capacitação de pessoal para manutenção dos sistemas de diferentes aeronaves, a Atech também conduz, em parceria com a FAB e a SAAB, as atividades de transferência de tecnologia, desenvolvimento dos sistemas de suporte à missão, treinamento e simulação da aeronave Gripen E/F no Programa F-X2.
A Atech atua em diversos outros projetos de sistemas embarcados em meios terrestres, aéreos e marítimos, executando atividades de Desenvolvimento e Integração de Sistemas Embarcados; Desenvolvimento e Integração de Sistemas de Suporte a Missão; Logística: manutenção, treinamento de operações, treinamento de manutenção e documentação.
Na Marinha do Brasil, destaca-se por sua presença no desenvolvimento do Sistema Tático de Missão Naval dos helicópteros (versão operacional) adquiridos dentro do Programa H-XBR.
Iniciado em 2012, o programa está em avançado estágio de aprestamento da primeira unidade da versão operacional da Marinha (atualmente cumprindo uma ampla fase de voos de testes).
O Sistema Tático de Missão Naval (NTDMS), composto por hardwares e softwares responsáveis pelo gerenciamento de informações transmitidas pelos diversos sensores instalados na aeronave, tem como objetivo auxiliar o operador tático e o piloto na tomada de decisões.
Além disso, o NTDMS faz a interface de comunicação com o sistema de arma do helicóptero, mísseis anti-navio do tipo Exocet e (futuramente) MANSUP, este de fabricação nacional.
Segredos Militares na Berlinda?
Essa exposição de uma parte do portifólio EDS ilustra o que a empresa representa hoje, a capacidade do Estado Brasileiro de atuar e controlar tecnologias críticas em radares, sensores, sistemas de comando e controle, links digitais criptografados de comunicação, incluindo aí a interface com o SGDC (Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações), gerenciado pela Visiona, tecnologias de propulsão, guiamento e controle de mísseis do tipo superfície-superfície (de cruzeiro), superfície-ar (antiaéreo), ar-ar (combate contra aeronaves), e ar-solo/ar-superfície (ataque ao solo/superfície), incluindo aí mísseis anti-radiação e armamento inteligente guiado por laser e GPS, os vitais mísseis anti-navio, etc.
Os comandantes militares brasileiros são frontalmente contra qualquer negociação que envolva esse portifólio, obtido a um custo muito alto em termos de tempo, dinheiro e pessoal.
Recursos que a Nação Brasileira investiu e não deseja entregar ao controle de uma empresa estrangeira, especialmente quando se sabe que a Boeing e outras empresas norte-americanas gigantes do setor são constantemente influenciadas em seus negócios pelos humores do Congresso Norte-Americano, extremamente protecionista em relação a sua indústria de defesa nativa, simplesmente a maior do mundo em valores, capacidade produtiva e tecnologias agregadas.
A posição do Governo Brasileiro e das Forças Armadas é muito clara, essas capacidades NÃO estão em negociação.
OBS do Autor: A verificar a perenidade de recursos apara os investimentos necessários aos Programas Estratégicos das Forças Armadas. O discurso da negativa governamental, baseado na proteção da nossa Base Industrial de Defesa brasileira, deverá ser comprovado na prática com o anúncio de um amplo pacote de investimentos no setor em 2018, recompondo perdas acumuladas, mitigando atrasos causados pela falta de compromisso fiscal e alavancando capacidades há muito necessárias. Qualquer atitude diferente desse compromisso com a BID Brasil resultará na entrega desse valioso patrimônio humano e tecnológico “de bandeja” para o grande capital internacional.