O Governo Brasileiro apresentou na última terça-feira (31/10) a Proposta de Orçamento definitiva para o ano de 2018 e, com isso, indicou os valores disponíveis para serem aplicados em políticas públicas e investimentos no próximo ano.
Comparando esses números com os do orçamento de 2017, conclui-se que a previsão para o valor total de gastos subiu 2,98%, totalizando R$ 3,5 trilhões, em linha com o teto de gastos (que permite um aumento de até 3% em 2018).
Os valores incluem gastos com pessoal e encargos, despesas correntes, investimentos, gastos financeiros, reserva de contingência, juros, encargos e amortização da dívida.
Do total de R$ 3,5 trilhões, R$ 1,77 trilhão foi reservado para o serviço da dívida e, outro R$ 1,72 trilhão, para gastos com pessoal, despesas correntes, investimentos e reserva de contingência.
A indicação de valores, neste primeiro momento, não significa necessariamente que estes recursos serão gastos. Isso porque o Congresso Nacional ainda tem de avaliar a proposta e pode fazer alterações.
Além disso, o governo também pode optar por bloquear recursos (contingenciar) no próximo ano para cumprir a meta fiscal, ou seja, o resultado pré-fixado para as contas públicas, que é de déficit (despesas superiores às receitas) R$ 159 bilhões nas suas contas – algo que é muito comum.
Quem perdeu dinheiro?
A proposta de orçamento para o próximo ano mostra que houve uma forte queda de recursos disponibilizados para algumas áreas, entre as quais a Defesa Nacional.
Fortemente atingida pelos cortes, a Defesa Nacional terá de lidar em 2018, com uma previsão orçamentária de R$ 11,03 bilhões, contra R$ 13,3 bilhões neste ano, uma queda de 16,97%, o equivalente a R$ 2,25 bilhões.
O ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, afirmou que essa é a “realidade” do governo neste momento. Ele acrescentou que o Executivo procurou manter o funcionamento dos programas sociais em um “nível bom” e, também, dar andamento às obras mais importantes de infraestrutura.
“Temos de fazer escolhas. Temos de ter equilíbrio entre as diversas atividades. O governo não tem nenhuma atividade desnecessária. Fizemos uma proposta que está muito equilibrada dentro das dificuldades que temos, pois há uma parte do orçamento, que são as despesas, crescendo o dobro do limite do orçamento. Tem uma parte que está comendo o orçamento das outras: a Previdência”, afirmou.
Dentro do escopo de interesse desse artigo, é importante citar que foram beneficiados com mais recursos no próximo ano os sistemas de gestão de riscos e de desastres (+86%, ou R$ 803 milhões a mais) e de energia elétrica (+8,37%, ou R$ 81 milhões).
ORÇAMENTO – Comparativo entre 2017 e 2018
Na tabela abaixo, divulgada pelo Ministério do Planejamento, selecionamos áreas de atuação governamental relacionadas direta ou indiretamente com Defesa Nacional e Segurança Pública, Ciência, Tecnologia e Inovação (Pesquisa & Desenvolvimento), Comércio Exterior, Política Nuclear, Política Espacial, Indústria de Óleo & Gás e Ministério da Defesa.
Área ou programa | R$ em 2017 | R$ em 2018 | variação % |
Ciência, tecnologia e inovação | 3,5 bilhões | 2,8 bilhões | -18,09% |
Gestão de riscos e desastres | 925 milhões | 1,7 bilhão | 86,8% |
Petróleo e gás | 123,9 milhões | 82,2 milhões | -33,6% |
Política espacial | 266,8 milhões | 151,4 milhões | -43,2% |
Defesa nacional | 13,2 bilhões | 11 bilhões | -16,9% |
Política nuclear | 1 bilhão | 614,6 milhões | -40,5% |
Política externa | 1,1 bilhão | 935 milhões | -21,8 |
Ministério da Defesa | 54,9 bilhões | 58,7 bilhões | 7,04% |
Fonte: Ministério do Planejamento |
Um orçamento para se lamentar
A grave crise na Ciência Brasileira pode ser medida pelo corte expressivo de 18% no orçamento do próximo ano.
Projetos estratégicos como o Acelerador de Luz Sincroton, em fase final de construção em São José dos Campos (SP), ou o Reator Multipropósito Brasileiro de grande porte (RMB), que terá 30 megawatts de potência e capacidade de atender à demanda nacionais em áreas como testes de irradiação de materiais e combustíveis nucleares ou a realização de pesquisas científicas e tecnológicas com feixes de nêutrons, estão correndo sério risco.
O reator RMB será construído no município paulista de Iperó, a 130 quilômetros de São Paulo, junto ao Centro Experimental de Aramar, da Marinha do Brasil, local onde é desenvolvido o protótipo do Submarino de Propulsão Nuclear Brasileiro.
Parte do terreno – uma área de 1,2 milhão de metros quadrados – foi cedida pela Marinha para a Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), e a parte complementar de 800 mil metros quadrados necessária foi cedida pelo Governo do Estado de São Paulo.
No total, o empreendimento RMB conta com uma área de mais de 2 milhões de metros quadrados, o que possibilitará a transformação do local no principal polo de tecnologia nuclear do país, pois terá dois reatores nucleares (o de pesquisa, RMB, e o de teste, Labgene) e toda uma importante infraestrutura laboratorial de tecnologia nuclear.
A descontinuidade ou abandono desses programas trará como consequência imediata o exôdo de cientistas e pesquisadores brasileiros de altíssimo nível para nações mais avançadas cientificamente, onde a Ciência é levada a sério e entendida como fator de desenvolvimento nacional.
A Gestão de riscos e desastres vai receber um incremento de 86,8%, um salto quântico expressivo. Projetos como o Sistema Nacional de Comunicações Críticas (SISNACC) e o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres receberão um novo alento, atuando com mais eficácia no gerenciamento dos desastres naturais e climáticos, especialmente na época das chuvas (de janeiro a abril).
Dando continuidade a crise que assola a Petrobras, o corte de 33,6% significa que encomendas de navios tanques e plataformas de exploração, necessárias no Pré-Sal, ficarão postergadas para um segundo momento. A revitalização da construção naval brasileira, muito dependente de encomendas da indústria de óleo & gás, permanece também em segundo plano durante 2018.
A “Política Espacial”, para esse autor algo inexistente no País, sofreu um corte de 42,3%. Apesar do Governo sinalizar com a provável encomenda do 2º satélite SGDC, enquanto vai gradativamente colocando o primeiro em operação, o corte anunciado significa que a utilização da Base de Alcântara como centro espacial para lançamento de satélites, pelo Brasil, torna-se a cada dia uma visão impossível de ser alcançada.
Considerando que a Base de Alcântara tem a melhor localização no mundo para lançamentos de satélites, pois os foguetes lançadores partindo dali gastariam menos combustível (consequentemente sendo mais leves), e levando-se em conta os estágios atuais dos programas de desenvolvimento para propulsores, cargas úteis, sensores e tecnologias associadas, todos evoluindo a passo de tartaruga, pode-se concluir que a tal “Política Espacial” é um engodo midiático do Governo Brasileiro, pois o País preferiu pagar a Agência Espacial Européia para lançar o SGDC a partir da Guiana Francesa, algo que poderia ser feito em Alcântara se nos anos anteriores essa “Política Espacial” tivesse auferido alguma efetividade, em que pese os hercúleos esforços da Força Aérea Brasileira e pesquisadores/cientistas envolvidos para alavancar o Programa Espacial Brasileiro.
Sucessos pontuais no lançamento de foguetes de pesquisa em parceria com outros Países e o desenvolvimento de novos propulsores merecem destaque positivo.
A Defesa Nacional sofreu corte de 16,9%, o que significa mais atrasos em vitais Projetos Estratégicos das Três Forças. Somado a isso, o corte de 40,5% na “Política Nuclear”, majoritariamente tocada pela Marinha do Brasil, associada com entidades civis, significa que o PROSUB, na sua vertente nuclear, está acumulando atrasos e perdas expressivas, o que já começa a levantar questionamentos internos quanto a capacidade do Governo em concluir o Programa de Submarinos da forma como foi planejado.
No entanto, foram registrados avanços importantes. O Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP) executa, atualmente, a montagem eletromecânica do Laboratório de Geração de Energia Núcleo-Elétrica (LABGENE), localizado no Centro Experimental Aramar, em Iperó (SP).
A partir do LABGENE, sistemas navais para propulsão a vapor serão testados, principalmente na parte nuclear, o que é vital para o Submarino de Propulsão Nuclear Brasileiro. Nesse programa de testes, incluiu-se a operação conjunta de diversos sistemas eletromecânicos, em escala 1:1, como turbinas a vapor saturado, condensadores, painéis elétricos, bombas de circulação, sistemas de controle e instrumentação associada.
A maioria dos componentes ora em montagem foi projetada e construída no Brasil. Com a diminuição dos recursos, essa vital parte do programa pode sofrer atrasos difíceis de serem recuperados posteriormente.
A perenidade de recursos para a “Política Nuclear” brasileira ainda é uma quimera, um desejo sem resposta, um sonho distante.
Nesse cenário desalentador, verificar um corte de 21,8% na política externa é algo sintomático. Se o Brasil não consegue cumprir os deveres de casa internos, como pode almejar algo maior entre nações “sérias”, assim reconhecidas por apresentarem democracias verdadeiras e não uma “ditadura jurídico-parlamentar” eivada de escândalos de corrupção, narcotráfico, tráfico de influências e disputas entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, sempre em detrimento do bem estar da população?
Por fim, o aumento de 7,04% no orçamento do Ministério da Defesa deverá cobrir despesas de custeio da própria pasta.
Não se sabe ainda de onde virão os recursos necessários para treinar tropas e preparar equipamentos para novas participações brasileiras em missões de paz no exterior.
A propalada participação brasileira em ações na África Central, a partir de meados de 2018, está assim bastante comprometida.
Como exemplo, a aquisição de viaturas IVECO LMV, selecionadas pelo Exército Brasileiro em 2016 para serem empregadas nessas missões, ainda não decolou por falta de recursos.